Inicio a minha viagem no tempo e chego ao ponto central e um dos mais bonitos do Bairro da Fábrica: o jardim da Praça da Portaria1 ou simplesmente “Jardim”, como costumava dizer para minha mãe quando saía para brincar: “- Vou ao jardim!”
Ali acho que era o ponto nevrálgico de todas as atividades do bairro, pois estavam diretamente relacionados às atividades da empresa. Por aqueles portões da Portaria entravam e saíam os caminhões com mercadorias, carros e kombis com chefes e funcionários qualificados do escritório. Até mesmo o Presidente da República, Castelo Branco já passou por ali com sua comitiva em visita a Melhoramentos. Foi uma agitação geral dos moradores neste dia para ver os carros pretos desfilando pelo bairro. Tempo de ditadura militar.
Numa tentativa de descrever as belezas deste local, vou seguir minha visão da memória num raio de 360 graus, no sentido horário. Sento-me na mureta de pedras que ladeiam o jardim bem em frente à Portaria. Fico a contemplar o gramado e o lago artificial cheio de plantas aquáticas de onde, em determinadas épocas, desabrochavam belas flores. No meio do lago uma pequena fonte jorra água para o alto mantendo a oxigenação das águas para os peixes que nadam compassada e despreocupadamente. Os mesmos peixes que, algumas vezes, insisti pescar escondido entre as plantas que circundavam o lago, sempre com o maior medo que algum guarda me flagrasse.
Meu olhar volta-se agora para o alto da torre dos escritórios e se fixa no grande relógio. Este velho companheiro que incessantemente marcou, minuto a minuto, o compasso de um tempo feliz. Fico a contar quantos momentos maravilhosos vivi neste recanto, junto aos meus irmão e amigos. Lembro-me de uma foto tirada ali no jardim com meus irmãos e ainda hoje embala as doces lembranças de uma época de ouro de minha existência, tempos de uma infância feliz.
O relógio marca 14 horas e ainda posso ouvir o som estridente da sirene anunciando, para alguns, o inicio e para outros, o fim do turno de trabalho da fábrica. Este apito soa, em minha memória, como uma suave música.
Vejo homens e mulheres apressados chegando, a pé ou de bicicleta. Aqueles que vêm de bicicleta acomodam suas “magrelas” no espaço reservado a elas, ao lado do marmiteiro, um balcão de madeira todo onde as pessoas deixavam as marmitas com as refeições para os seus entes que ali trabalham.
Os guardas abrem a porta-sanfona de metal para permitir a entrada e saída dos funcionários que, em fila, vão apanhando, um a um, o seu cartão de ponto para registrar a hora de entrada ou saída do trabalho. O som compassado do relógio ponto e a algazarra das pessoas também permaneceram gravados em minha memória. Passam pelos guardas, sempre alinhados com seus uniformes e quepes, e que marcou a sua presença em nossa existência como o Quarenta, um símbolo desses profissionais. O cumprimento e gozações entre os funcionários e os guardas são constantes.
Ao lado direito da porta que conduz ao marmiteiro, há um quadro de avisos. Ali estão os anúncios dos bailes no Nobrinho, e dos jogos e escalação do time do Clube Recreativo Melhoramentos, o CRM, para o próximo final de semana. É a garantia de diversão para todos os moradores do bairro.
A minha frente ainda, as portas de aço da garagem, onde são guardados os carros dos Diretores da Melhoramentos e a seguir, visualizo as primeiras casas da Rua do Escritório. Continuando, a rua como quem desce, em primeiro plano, para a Garagem, onde meu pai por muitos anos trabalhou, e depois para o Centro Comercial do bairro. Ali ficava o Armazém do Genésio, a quitanda do Sato, o açougue, um tempo do Rui e em outro dos Marin, não sei precisar a ordem dos fatos,
Acima da Garage, existia outro jardim, complementando a paisagem do lugar, todo gramado, com árvores pau-de-ferro, quaresmeiras roxas entre outras. Ao lado desse jardim, havia um tanque onde era armazenado óleo para uso da Melhoramentos. Tem início então, a rua que desce para o Bairro Chique, onde fica o Grupo Escolar Alfredo Weiszflog, a minha primeira escola, que será, mais adiante, motivo de uma abordagem à parte. Em seqüência avistava-se uma sala onde fiz o curso de preparação para o Ginasial, passando pela casa da Dona Ruth e filhos Serginho e Sandra, que vendia aqueles pirulitos em forma de guarda-chuva e eram uma delícia, depois a casa dos Nanni, da Ana Maria e Cláudio, e outras casas que já não consigo lembrar quem eram os moradores. Quem sabe alguém da comunidade possa ajudar-me nesta tarefa. Lembro apenas mais uma casa ao lado daquela trilha que descia para a Vila Pereira, onde morava o Sr Algeu Sapateiro e seus filhos Alceu, com quem estudei, e Alfeu.
Mas voltando ao Jardim. Olhando à direita da rua que desce para o Grupo Escolar erguia-se, imponente, a casa do Sr Atilio Massinelli, e na rua principal que desce em curva quando se vem do Filtro, via-se a casa dos Barnabé´s: do Maxuxo, do Clodoaldo e da Belita e da Tatinha.
Completando este rápido giro, vejo a velha Rua da Pensão. As duas primeiras casas desta rua foram destruídas e o espaço transformou-se em estacionamento para carros. E para esse ponto que vou dirigir-me.
O retorno à minha rua.
Prossigo em minha caminhada. Deixo o Jardim e desço a rua que inicia na Portaria I. Ela segue paralela a Melhoramentos.
Rua da Pensão, 48. É neste endereço que minha lembrança marca o início de minha percepção como pessoa. Nasci na Vila Leão. Logo depois, mudei-me para esta rua.
Vou cumprimentando um a um os meus saudosos vizinhos: O Sr. Francisco Nicola (Paco), a D. Ida e filhos Jaime e Elenice; a D. Zelinda; o Sr. Juca Fávero, a D. Nair e filhos Nilza, Nelson e Nivaldo; O Sr. Antonio e a D. Irene; o Sr. João Bertollo, a D. Rosalina e filhos Gildo, Kica, Geraldinho, Ângela e Lola. Eis ai a minha casa. A casa do Sr. Odair Miranda, Julieta de Souza Miranda e filhos Neusa, Oswaldo, Cleusa, Elza, Odacir, Ilza, Eduardo e Fernando. A seguir; o Sr. Rafael Nicola, a Dona Téia e a filha Oracina e o filho Orestes; o Sr. Antonio (Pão Doce), a esposa e filhos, Lídia, Dárcio, Carlinhos e mais alguns pequenos.
Entrando a esquerda, numa viela existente, a famosa Pensão, que dava nome à rua. Era o maior prédio da rua. Não lembro o nome dos proprietários, mas eram os pais do Ari, Valéria e Dirceu Mandri. Só sei que ali funcionava um restaurante que servia refeição e marmitas para os funcionários da Cia. Melhoramentos. Funcionava também uma sorveteria. Depois veio o Sr. Aquiles Nanni e esposa. E para eles eu trabalhei como sorveteiro. Mas eu conto essa passagem numa outra oportunidade.
Depois então da Pensão, as casas do Sr. Antonio Mazzivieiro (ou seria Aníbal?), a esposa e filho Abel, o Sr. Paulo Casarin, a esposa e seus filhos Pérola e Carlos; O Sr. Ivo Rosolen, a esposa e seus filhos Ilton e Adilson (Toco); o Sr. Mario Pereira, a D. Maria e suas filhas Ede e Vanni.
Seguindo rumo ao final da rua, a D. Lourdes e o Ditão PM; o Sr. José Berilo dos Santos, a D. Rosa Lopes e seus filhos Glória, Alfredo, Beth e Arlindo. Ali também morava o Maquináia e suas famosas miniaturas de trens que ele construía. Ah! Ele tinha também as bicicletas. Todas devidamente numeradas. Ele gostava de emprestá-las apenas para as meninas.
A última casa da rua ocorria os ensaios da Banda Musical da Melhoramentos. Quantas músicas ainda ouço em minha memória!
Quantas saudades de toda essa gente! Evidente que esqueci alguns nomes, mas a fisionomia de cada uma dessas pessoas queridas está presente e carinhosamente guardada em minha memória. Gostaria, nem que fosse por alguns minutos, poder voltar no tempo para reencontrar e abraçar cada uma delas. Gente boníssima, gente amiga, membros desta grande família melhoramentina.
Que Deus sempre os abençoe. Estejam onde estiverem!
Oswaldo Correa Miranda
Sobre a crônica : A praça da Fábrica.
Belíssima crônica e com detalhes muito importantes, principalmente para aqueles que, como eu não conseguem recordar tantos lugares e pessoas daquela época.
Parabéns ao Neno Miranda pelo escrito e que ele também nos encante com suas crônicas saudosistas.
Fico feliz em saber que o grupo de participantes deste bairro virtual vem aumentando dia a dia enriquecendo cada vez mais o espaço do Jornal A Semana .
Fatima Chiati