Em setembro de 1.965 nos mudamos da Vila Leão para a Cresciúma, centro de Caieiras, lugar dos sonhos da minha madrinha (Maria Ap. Sant’Anna). Sonho este possível graças a um empreendimento da Companhia Melhoramentos que, já com o intuito de desocupar as áreas ao redor da fábrica, construiu um grupo de 20 casas na Rua 4 e Rua 5 do Jardim Santo Antônio. Mais tarde estas ruas seriam renomeadas e passariam a se chamar: Rua Guadalajara e Rua Portugal.
Quando passamos a morar ali, a Rua 4 era o “point” da criançada . Não havia asfalto ainda, as casas tinham fossa séptica e agua encanada proveniente de um poço no quintal que, através de uma bomba elétrica, abastecia a caixa d’água. As moradias possuíam 3 dormitórios, cozinha grande, sala, e um banheiro no corredor. O quintal e a frente eram espaçosos e muitos ainda, por algum tempo, mantiveram os hábitos melhoramentinos de plantar verduras e criar galinhas. Em pouco tempo, diante da modernidade, isto também foi esquecido . No entanto, a felicidade maior da minha madrinha foi mesmo ter um banheiro dentro de casa , cômodos com piso em tacos de madeira e pia de granilite na cozinha. Já nós, crianças, pouco nos importávamos com estes detalhes. Gostávamos na verdade, da Rua 4, comprida, imensa, deserta e de terra vermelha e fofa. Durante o dia andávamos de bicicleta, rodávamos o pião, bambolê ou simplesmente escorregávamos pelos barracos. À noite, porém, nos reuníamos para outras brincadeiras. Pulávamos corda, brincávamos de pega-pega, de queimada, esconde-esconde e de roda. Lembro-me da turma toda: Eu, minha irmã Joana Chiati, Nilza Carezatto e sua irmã Sirlei, Eva Pilon e seu irmão Adão, Marcos Francisco Nobre, Pedro e Paulo Carezatto, Olavo e Ataíde Pinheiro, Adalberto e Luiz Pavan, Ronaldo Gonçalves (o Didi), Alfredo Ullman, Leda e Neuza Menegatti , Wagner ( Waguinho), Gilberto e Gildete Menegatti.
Foi uma turma que rapidamente se agigantou, já que aquele ponto turístico noturno se tornou a atração mais divertida para as crianças de outras ruas próximas. Ali se brincava até quase 22 horas, sob a iluminação de fracas lâmpadas incandescentes , bastante comuns naquela época. Vez ou outra, sentávamos em círculos para brincar de passar anel ou batata quente. Vibrávamos com tudo e com todas as brincadeiras que tornavam, as noites daquela década de 60, em pura festa. Foram tempos de magia e singeleza que se refletiam no olhar de cada criança daquele unido grupo. Entretanto, como tudo passa, este tempo também passou. A rua mudou de nome, o asfalto chegou e a luz florescente transformou comportamentos, mudando hábitos. Por muito tempo ainda , nós jovens, pertencentes àquela turma, ainda mantivemos o mesmo contato amistoso. Paramos de correr e pular e passamos a nos reunir nas calçadas, nos portões ou no jardim de alguma casa. Paramos de brincar, mas passamos a ouvir músicas, a falar de amores, medos e incertezas da juventude. Infelizmente, os trajetos mudaram e muitos até, nunca mais se encontraram. Ficou, no entanto, a certeza de que naquela encruzilhada de nossas vidas, a Rua 4 foi extremamente importante, decisiva, cravando em nossa memória, risos, alegrias e emoções indescritíveis. Hoje, ela é uma rua comum... A Rua Guadalajara. Não guarda mais o barulho e nem a gritaria daquela turma tão animada. Os sons, que hoje lá ecoam, são outros, são cruéis e até melancólicos pela falta daquelas crianças tão simples, divertidas e felizes.
FATIMA CHIATI