18/06/2013
Pirulitos de Guarda Chuva

Nós crianças da Fábrica Melhoramentos, na década de 60, estudávamos, todas, no mesmo estabelecimento onde uma interessante “lancheira” ,sempre levada à tira colo, fazia parte de nosso uniforme escolar. Nela ,por muito tempo, carreguei minha  garrafinha plástica cuja tampa se transformava em copo. Levava  suco de laranja,  de limão que muitas  vezes  amargava, café com leite e o delicioso chocolate  da Toddy.  O lanche   era especialmente  divino, apesar  de  murcho e engordurado pela manteiga ou pelo ovo frito, mas a  maioria das crianças levava a mesma coisa. Uma única vez  no entanto, lembro ter visto alguém com uma maçã . Eu, todavia, adorava o meu pão com ovo. Aquele, com a gema durinha, levemente salgada,  feito com tanto carinho pela minha madrinha e embalado  cuidadosamente  num guardanapo de pano ou na  folha de papel pardo (daqueles utilizados no Armazém para embrulhar os pães).
Durante a aula o cheiro  do lanche  era simplesmente irresistível e quando  finalmente, tocava  o sinal lá saía eu correndo na ânsia de devorá-lo entre goles da limonada meio  amarga.
Afastada das modernidades, nenhuma criança da época, sonhava  comer  lanches mais sofisticados, salgadinhos, pizzas  e muito menos iguarias como  presunto, queijos e rosbifes. Nosso maior  deleite talvez tenha sido mesmo, a incomparável mortadela Ceratti,  degustada esporadicamente ou unicamente nos finais de semana. Também não nos afogávamos em refrigerantes ou sucos artificiais. Isto era coisa rara, surpresa nos  domingos ou em ocasiões especiais.
Na década  de 60 também  não usufruíamos de cantinas ou lanchonetes dentro da escola. O lanche escolar era levado de casa, mas garantia nosso sustento, nossa qualidade de vida e principalmente, nossa saúde.
Talvez por esta razão, a única aberração gastronômica tenha sido os deliciosos pirulitos da Dona Rute, vendidos em sua própria casa, na Rua do Grupo Escolar.
Todas as crianças no final da aula iam para  lá comprar os famosos “puxa- puxa”, que ela  mesma preparava. Havia muitos sabores à nossa disposição: Groselha, laranja, café, chocolate, amendoim e o de coco queimado, meu preferido. Ficavam dispostos e encaixados num tabuleiro de madeira cheio de furos. Eram embrulhados num papel bem  fininho e transparente, parecido com  papel manteiga. Tinham o formato de cone  e  por mera semelhança, foram  batizados  de “ pirulitos de guarda-chuva”. Tinham  ainda ,um cabinho de madeira  que no final sempre se quebrava, tantas eram as mordidas, lambidas e o  estica-estica.
Ninguém ia pra casa sem comprar os pirulitos de guarda-chuva  da Dona Rute.
Ainda me lembro da entrada da casa dela  e da escada que dava acesso à área onde ficava o tabuleiro de “guarda chuvinhas” melados. Lembro também, da fila de crianças e da nossa sofreguidão em saborear aquele doce tão simples e tão requisitado. Lembro-me das mãos melecadas, do doce grudando nos dentes  e do fio comprido que se formava quando o esticávamos da boca.
Hoje, nenhuma criança se interessaria  por um doce daqueles pois, outros mais calóricos e artificiais preenchem as vitrines das lanchonetes escolares. O pirulitos “ puxa- puxa” não seriam mais  uma estrela no recreio escolar. Foi apenas no passado e  teve seu apogeu encantando  uma geração cujo paladar nada  tinha de exigente.
E a inocência desta geração simples teve lá suas vantagens. Por desconhecermos a alta culinária industrializada, hoje predominante na maioria das escolas, nos realizamos  com as coisas mais simples do cotidiano. Um  pouco nos bastava , nos saciava e nos fazia imensamente felizes.
Tivemos a sorte de poder consumir  alimentos cultivados ,preparados  em casa,  naturais, sem processos químicos e sem  agrotóxicos. Fomos privilegiados.
Em contra partida, como  nem tudo é tão perfeito, também nós, humildes crianças melhoramentinas, não resistimos  à tentação do açúcar. Esquecemos  regras, recomendações e  nos entregamos ao pecado da gula, nos lambuzando sem frescuras com aqueles pirulitos de guarda-chuva...Doces, gostosos  e carinhosamente  produzidos pela inesquecível Dona Rute .
Que saudades! Que boas lembranças!

FATIMA CHIATI
No Meu Blog:  www.fatimachiati.com.br   fotos dos inesquecíveis pirulitos de guarda-chuva
 



Leia outras matérias desta seção
 » A Semana Santa na Vila Leão
 » Religiosidade e religião de amor
 » Caminhar é preciso
 » Recordações da Av. dos Estudantes
 » Os gênios do Colégio Walter Weiszflog
 » Fragilidades de todos nós
 » As mentiras na Internet
 » Reverências aos nossos amores
 » O amor fora do ar
 » Amor, política e relacionamentos
 » As históricas enchentes de Caieiras
 » Homenagem às mulheres
 » Algo mais
 » Trégua de Natal
 » Atitudes de autoajuda
 » O dia de finados
 » Mãe é aquela que cria
 » A internet não esquece
 » Capelinha da Vila Leão
 » Benzedeiros e benzeduras
 » Casa de mãe
 » Uma luz no fim do túnel
 » Um Diário para Sophia
 » Um brinde à ociosidade
 » A carteira perdida
 » A fonte luminosa
 » Brincando pelos tempos
 » Lembranças de Natal
 » O poço artesiano do hospital
 » A lata de botões
 » O Tatu embalsamado
 » A gaveta da cômoda
 » As artesãs da minha vida
 » O antigo Correio de Caieiras
 » Medo do escuro
 » Reencontro com o passado
 » O Baú da vida
 » Um Circo em Caieiras
 » reflexões de final de ano
 » Parque de diversões em Caieiras
 » A Loja da Fonsina
 » Pirulitos de Guarda Chuva
 » O caminhão pau de arara
 » Duelo entre patrões e empregados
 » A Mestra com carinho
 » Os bons tempos da Pharmacia
 » O sorveteiro da Vila Leão
 » Jovens Tardes de Domingo, o "Clubinho"
 » A internet à beira do caos
 » Mulheres maravilhosas
 » Natal numa casa da Rua Guadalajara
 » Brincadeiras na rua 4
 » Viagem de trem, sofrimento e saudades
 » A vida é uma novela
 » Essa tal felicidade
 » Amizades verdadeiras
 » Teorias sobre o amor verdadeiro
 » O dia 7 de Setembro
 » De bem com a vida
 » O Colégio Walter Weiszflog
 » O Armazém da Fábrica
 » A verdadeira face da aposentadoria
 » O preço da beleza
 » Os filhos na planilha financeira
 » A Segunda dança no Salão Nobre .
 » O Jardim de Infância em 1963.
 » Os Jardins da Vila Leão .
 » A ÁRVORE QUE CHORA.
 » A Rua da Bomba .
 » O quartinho mal assombrado do Grupo Escolar .
 » Semana Santa na Vila Leão .
 » A cadeira com presentes !!!
 » O campinho da Vila Leão .
 » O Salão Nobre da Fábrica .
 » Tributo a uma grande mulher .
 » A cesta de Natal .
 » Almoço de domingo na Vila Leão .
 » O vendedor de sandálias havaianas .
 » Um carnaval no Salão Nobre .
 » A primeira dança no Salão Nobre .
 » O conserto da televisão .
 » Obras de arte em telas de arame.
 » Banho de Bacia na Vila Leão.
 » Os cinemas da Lapa
 » Dia dos namorados
 » Corpus Christi
 » Xuxa e sua volta ao Trono
 » As festas de Santo Antonio
 » O Banheiro da Estação
 » Veteranos da Emed
 » O amor no novo milênio.
 » Terceira idade, os exageros.
 » O luxo da reciclagem.
 » As festas de fim de ano .
 » Alcoolismo e juventude.
 » Sua majestade o celular .
 » O Brasil na chuva e na lama .
 » A sacolagem no meio ambiente .
 » A hipocrisia ao alcance de todos.
 » O Universo Pet.
 » Indignação.
 » A Rocinha em cena .
 » A generosidade no Natal.
 » O trânsito nosso de cada dia .
 » Ano novo , tudo velho .
 » A dificil trajetória de um pai .
 » Triste Realidade.
 » Os ídolos em nossas vidas.
 » Bulling em dois tempos.
 » A Morte santifica .
 » Abençoados os vizinhos de ontem !!!
 » A Semana Santa na Vila Leão
 » As famílias e a TV
 » Nas rodas da Bicicleta
 » Fazendo as pazes com o passado

Voltar