Vamos prosseguir na viagem do Trem da Nostalgia.Agora estou saindo de casa, lá da Vila Leão.Vou indo de novo ao Jardim de Infância.Ano 1963. Primeiro o almoço, o banho .Depois vestia o uniforme, um avental estampado azul e branco, todo franzido, cheio de abas, palas e um grande laçarote na cintura.Pegava, minha lancheira com um sanduíche de ovo frito ,uma garrafinha de limonada , e o guarda-chuva, sempre combinando com a roupa. Saindo da casa da minha madrinha, pelo quintal dos fundos, estava no campinho, um local de chão batido, às vezes empoeirado, onde sempre havia jogos de malha, futebol,bolinha de gude, quermesses e onde tantas vezes eu pulei amarelinha com as meninas da rua.Seguia chamando os demais : A Rose Godoy, o Aroldo Santana, a Iracema e outros que não me lembro mais. Íamos em turma, meninos e meninas, brincando e ás vezes brigando . Saindo da Vila Leão, a última casa ao alto que passávamos era dos Fava. Seguíamos então e uma longa estrada ladeada pelo rio e por árvores se apresentava à nossa frente. Iniciava-se assim um caminho assustador e temido por muitas pessoas. Era o caminho da Volta Fria. Nessa hora, o silêncio era mortal, como o local.De um lado o rio quase alcançando a rua, do outro, mata,plantações de milho no alto de um morro e um trecho extremamente úmido e frio. Daí o nome : Volta Fria. Contava-se na época que o lugar era mal assombrado. Verdade ou mentira, o fato era que era um lugar que dava medo mesmo!Talvez pelo silêncio, pela ausência de casas e quem sabe até pelo canto triste do pássaro Sem Fim, que entoava tristemente uma melodia ao longe, dando uma demonstração de solidão e morte. Passávamos quietos e rápidos, tamanho era o medo.Já quase no final da rota funesta e quase chegando à Ilha das Cobras, um trecho ainda mais frio e úmido nos fazia parar por instantes.E como numa fábula, pra combinar com a paisagem e a sensação triste do local, nos deparávamos com A árvore que chora.A poça de água existente nos pés da árvore nos fazia refletir ,admirar e perguntar: Qual seria o motivo daquela árvore chorar?Ficávamos um tempo ali, parados,sendo também gotejados e refrescados pelas lágrimas da árvore . Mas ainda tinha muito chão. Prosseguíamos, o mutismo e o silêncio desapareciam, a bagunça recomeçava e na Ilha das Cobras, mais crianças a nós se juntava:O Jackson, a Antonia Helena Maderick.Mais pra frente, parávamos na pedra do Valentim e em seu topo esperávamos mais crianças que agora desciam da Vila Nova.Seguíamos pela Vila Pereira, subíamos o atalho no barranco cercado de árvores e então chegávamos no Jardim de Infância. Fim de tarde, o caminho ao contrário . A Volta Fria era ainda mais assustadora, pois no fim do dia o sol já estava se escondendo, o local ficava ainda mais triste.A árvore que chora parecia chorar ainda mais pela noite que se aproximava.Coisas de criança e invenções de adulto! Descobrimos um bom tempo depois que o lugar não era assombrado e que a árvore nunca chorou.As lágrimas nada mais eram que conseqüência da umidade do local,que fazia com que a água vertesse pelo barranco e caísse aos pés da planta. Cientificamente explicável, porém dispensável, pois se soubéssemos da verdade naquela época, com certeza tudo aquilo não teria sido tão encantador como foi. Até mesmo o medo da Volta Fria marcou a vida de nós crianças das Vilas ao redor e a Árvore que chora tocou tanto nossos corações com suas lágrimas que hoje por incrível que pareça, somos nós que choramos de saudades!