As comemorações natalinas na casa da minha madrinha ( Maria Ap. Sant’Anna) sempre foram intensas . Para ela, nestas datas, as reuniões familiares tinham significado religioso, festivo, afetuoso e principalmente de união entre todos. Lembro-me que, já morando na Rua Guadalajara, centro de Caieiras, nossa casa vivia repleta de parentes e amigos que cultivavam este encontro. No início do mês de dezembro, eu já começava a embrulhar os presentes que ela carinhosamente comprava ou confeccionava com suas habilidosas mãos. Os pacotinhos já não ficavam na cadeira rosada, como na casa da Vila Leão. Ficavam sobre uma cômoda em seu quarto, mas, identificados como de costume. Eu então montava a árvore de natal e com sua ajuda ia lavando cortinas, limpando armários e preparando tudo para os dias de festas. Dizia ela que, a casa deveria estar em ordem não unicamente para receber as pessoas, mas para receber o menino Jesus, filho de Deus que seria homenageado nas novenas do Natal. Assim, durante aqueles dias que antecediam o grande dia, enfeitávamos os cômodos simples da casa tão sonhada e desejada por ela. Os gêneros alimentícios eram providenciados e por muitos anos eu a vi saindo de Caieiras para o Mercado da Lapa a procura de variedades e bons preços . Os convidados sempre traziam um prato pronto, mas como boa anfitriã fazia também a sua parte. Na véspera do Natal, logo cedo, já estava ao fogão e enquanto eu arrumava a casa, ela preparava farofas, saladas de batatas com maionese, frango assado e as castanhas portuguesas . Em nenhuma festa de final ano a sua famosa salada de grão de bico, palmito e peito de frango esteve ausente. Da mesma forma, a gelatina multicolorida com creme de leite. Eram os pratos mais requisitados naqueles dias tão quentes. Lembro-me do perfume se espalhando pela casa, da toalha de mesa, das louças cuidadosamente separadas para o almoço e de todas aquelas delícias que só eram saboreadas após a Missa do Galo. Por anos seguidos, mantivemos este costume que, no dia 25, se repetia com as sobras caprichosamente “reformadas” . Igualmente, a alegria, os risos e a euforia da véspera se repetiam animadamente. A casa ficava tão cheia de gente que, uma lona era esticada do lado de fora para acolher todos os convidados: Tia Cema, Tia Tatinha, Tio Moacir, Tia Terezinha, Tio Algeu,Tia Cici, Tio João, Tia Olga, Tia Ivone, Tio Luiz, Tia Ziza, Tio Ricardo, Jandira, Waill, Fanice, Artur, Adolfo, Jôce, Nena, Nice, Beth, Paulo, Didi, Mary, Ana Lúcia, Paulito, Maristela, Mireilli, Lívia, Rosana, Regis e muitos mais. Havia até, som ao vivo com uma banda comandada pela minha prima Magali Sant’Anna e meu primo Agnaldo Dell Porto . Ela no violão, ele numa guitarra, alguém num teclado e todos nós cantando juntos. Fazíamos o amigo secreto, e estendíamos a festa até a madrugada.
Mas como tudo que é bom, dura pouco, nossa ceia de natal não escapou à regra. Num determinado ano, da década de 70, um de nossos vizinhos reclamou do barulho e minha madrinha, resolveu abrir mão da festa familiar em favor ao bom relacionamento com seus estimados vizinhos. A partir de então, somente o almoço de Natal passou a ser comemorado, o que nem de longe colocou fim à nossa alegria. Muito pelo contrário, pois os almoços foram tão bonitos, apetitosos e divertidos quanto a ceia. A música noturna passou a ser tocada durante o dia. Ninguém mais reclamou e nós continuamos unidos nesta grande festa natalina.
Hoje aqueles encontros e reuniões não mais acontecem. Muitos já não estão entre nós, como ela, a madrinha e mãe de todos nós. Os que ainda estão vivos se dispersaram e pouco se reúnem daquela forma. Mas, certamente como eu, se alegram ao relembrar momentos tão especiais e maravilhosos numa casa tão cheia de amor e aconchego. Fiz parte destes momentos e me sinto até hoje parte desta grande família Sant’Anna que, mesmo não festejando o Natal ou fazendo ceias como antigamente, ainda assim, continua unida pelo amor, pelo afeto e principalmente pelas belas recordações de um tempo imensamente gratificante.
FATIMA CHIATI
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