O intrincado sistema financeiro internacional coloca todos os paises em um imbricamento assustador. Os resultados da produção de ferro no Brasil têm reflexos na China e alhures; uma guerra entre a Turquia e o povo Curdo põe o Banco Central Europeu em polvorosa; o estouro da bolha imobiliária dos EUA arrasta instituições financeiras da Ásia a América Central; o projeto de enriquecimento de urânio no Irã catapulta o preço do petróleo de leste a oeste; e por ai vai a colocar todos os governos na defensiva contra o inimigo comum: o dragão da inflação. No pandemônio global, o consenso é o controle do excesso da liquidez ou de iliquidez monetária – tarefa para a qual os Bancos Centrais de todos os países são os responsáveis, e os Presidentes dessas instituições são os mestres de prestígio e poder – em que pese o brasileiro Henrique Meirelles só se assemelhe com o ex-presidente do FED, Allan Greespan, na calvície extensa. Agora o prestígio se disputa com Ben Bernanke, novo chefe do Banco Central Americano, com quem o brasileiro pode ficar aliviado pela concorrência fresca, e, se for da vontade, mostrar mais poder. Mas, o Real supervalorizado, a alta do preço do petróleo, o estado limite da infra-estrutura (energia, portos, aeroportos, estradas, tecnologia), a elevada dívida pública, a máquina administrativa inchada e corrupta, o sufoco da carga tributária, juros estratosféricos, o aumento na demanda de bens de consumo – provocada por aumento de renda sem contrapartida de produção -, entre outros fatores colocarão o BACEN sob teste na verdadeira crise financeira que se instalará em 2008 no Brasil.
A Bolha
O Banco Central do Brasil enfatiza o controle da inflação por meio da flutuação do câmbio e do regime de metas, e libera geral o negócio de criar crédito por qualquer tipo de instituição. Nas calçadas das metrópoles, os transeuntes são seduzidos a obterem empréstimos, renovação de empréstimos, transferências de dívidas de empréstimos, troca de tipos de financiamentos, assinaturas de cartão de crédito de lojas, telefone com créditos, subscrição de ações com crédito, cheque especial, crédito consignado em folha de pagamento, consignado em benefício previdenciário, em antecipação de 13º, e outras tantas formas crudélicas de conceder crédito. Se a coisa está assim com o crédito de pessoa física, imagine com as pessoas jurídicas. Para facilitar esse exercício, basta trazer o fato de o BNDES não ter mais dinheiro para emprestar em 2007, em razão de sua clientela historicamente privilegiada e os projetos falidos e apadrinhados pelo Governo Federal já terem levado tudo e há demandas pendentes. Mas o BNDES já providencia mais recursos por meio de empréstimo ao Banco Mundial. Em resumo, o BC continua a induzir agentes a criarem excessivos montantes de iliquidez, que será a causa básica da crise do sistema financeiro brasileiro em 2008, porque não previne a criação da Bolha Brasil, porque falha na supervisão de todas as instituições que estão na praça a criar crédito especulativo sem contrapartida de produção, e porque não aplica a necessária norma de provisão para créditos podres das instituições que rolam, a la volonté, o refinanciamento do refinanciamento do refinanciado. Ou seja, o papel efetivo do BACEN deveria ser mais complexo do que o atual regime de metas inflacionárias bitoladas. Henrique Meirelles pode justificar, com voz arrastada, monótona, meio cantante, sem nuances, que teria havido uma estranha coincidência conjuntural internacional, como se estivesse no papel da Sra. Martin da peça A Cantora Careca, de Eugène Ionesco, mestre do teatro do absurdo. Dormia com o dragão, mas não lembrava.