Em 20 anos de Plano Real, retorno da renda fixa superou a do Ibovespa. CDI, índice que serve de referência aos investimentos de renda fixa, teve retorno quase 2.000% maior que o mercado acionário no período
Yolanda Fordelone - O Estado de S.Paulo
No longo prazo, a renda fixa tem se mostrado uma aplicação mais rentável que o mercado acionário. De acordo com levantamento da consultoria Economática, com a rentabilidade das principais aplicações desde o início do Plano Real - que em 2014 completa 20 anos -, o Certificado de Depósito Interbancário (CDI) rendeu 3.187%, quase 2.000% a mais que o Ibovespa, que representa a variação média das ações mais representativas da Bolsa. O CDI serve como referência para o rendimento dos investimentos em renda fixa, como fundos e Certificados de Depósito Bancário (CDBs).
Conta para o resultado o fato de que nos primeiros anos do real a taxa de juro era alta, por causa do regime de bandas cambiais adotado. Para manter a moeda brasileira valorizada, o governo precisava atrair recursos estrangeiros. E uma das ferramentas utilizadas para isso foi a manutenção do juro em patamares elevados, para que os estrangeiros fossem estimulados a comprar títulos públicos brasileiros. Em 1995, por exemplo, o CDI foi de 53%.
"O começo do plano foi um período de exceção, um contexto de bases econômicas ainda irregulares", afirma o professor de finanças Silvio Paixão, da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). O Plano Real, afirma, teve três fases: a introdução, em 1994; a de transição entre a situação de hiperinflação para uma inflação aceitável; e o momento de acomodação, após 1999. Naquele ano, o Brasil adotou o regime de metas de inflação e tornou o câmbio flutuante.
"Se você pegar o Índice Dow Jones num período de 40 anos, de bases econômicas estáveis, verá que a bolsa nos Estados Unidos foi o melhor investimento", diz Paixão.
Nestes 20 anos, os mercados sofreram não só na crise de 2008, iniciada no sistema financeiro americano. Houve a crise do México (1994), a asiática (1997) e da Rússia (1998). "Muita coisa aconteceu e as crises sempre tiveram um impacto no juro", diz o pesquisador Fabiano Guasti Lima, do Instituto Assaf. "O CDI se torna um refúgio ao dinheiro da renda variável em momentos de instabilidade."
Com o tempo, diz Lima, o juro diminuiu de patamar. "Mas este levantamento acaba mostrando que o Brasil ainda pratica altas taxas", afirma. Na semana passada, o juro básico da economia (Selic) foi elevado para 11% ao ano. Caso seja considerado o período de 1999 em diante, mais estável, o CDI ainda ganha do Ibovespa, mas por pouco: subiu 715%, ante os 657% das ações.
Ações. No caso do mercado acionário, o gerente de relacionamento institucional da Economática, Einar Rivero, diz que o Ibovespa representa as ações mais líquidas e há até pouco tempo tinha problemas de metodologia, o mesmo durante 45 anos. Foi somente em 2014 que o índice passou a incluir, além da liquidez da ação, também o valor de mercado das empresas. Desse modo, diminuiu-se as distorções no índice, como as causadas pela derrubada violenta das ações da ex-OGX. Esses papéis ganharam peso no indicador quando passaram a ser mais negociadas, na crise da empresa.
Por ser uma média do mercado, o Ibovespa pode não representar a carteira de certos investidores, que têm uma gestão mais ativa, entrando e saindo do mercado em diferentes momentos econômicos. Para aqueles que investem em empresas de segunda linha, a rentabilidade também pode ter sido melhor que a do Ibovespa. O índice FGV-100, por exemplo, que representa essas companhias de segunda linha, avançou 3.131% nos 20 anos do real - retorno parecido com o do CDI.
Dólar. Se a rentabilidade nominal fica na casa dos milhares, descontada a inflação o retorno é inferior. No CDI, cai para 629%. Para o dólar, a inflação foi ainda mais perversa. Sem considerar a alta dos preços, a moeda subiu 126%. Ao colocar a inflação na conta, o dólar caiu 50%.
"A moeda americana é de referência mundial. Quando você 'investe' em dólar, está fazendo uma arbitragem entre as moedas. Pode ser um instrumento de distribuição de portfólio, mas, sozinho, o dólar não é um investimento", diz Paixão.
A moeda americana geralmente é usada como investimento em momentos de crise. "O dólar é considerado uma reserva de valor, mas, quando passa a instabilidade, os recursos migram novamente. No longo prazo, o dólar apanha do mercado, sendo indicado apenas para períodos curtos, como no planejamento de uma viagem ao exterior", explica Lima.