TRIBUNAL DE CONTAS MANDA PARAR LICITAÇÃO SUSPEITA DE IRREGULARIDADES
Na manhã de quarta-feira, 26/07/2023, o Conselheiro Dimas Ramalho do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo determinou a imediata paralisação da Tomada de Preço nº 010/2023, e proibiu a Comissão de Licitação de realizar ou dar prosseguimento de qualquer ato a ela relacionada, ressalvada a possibilidade de revogação ou anulação desta licitação. No caso, a Prefeitura Municipal de Caieiras lançou a licitação para contratação de pessoa jurídica para prestação de serviços técnicos de advocacia para assessoria e consultoria jurídica, na área de direito público, nas Áreas do Contencioso Cível, Contencioso Trabalhista e Execução Fiscal, com valor estimado de R$ 1.428.000,00 (um milhão quatrocentos e vinte e oito mil reais) por ano.
AS IRREGULARIDADES APONTADAS:
Essa decisão de paralisação foi decorrente de 04 (quatro) Representações contra a licitação e contra o Edital apresentadas por Polimatas Gestão Organizacional e Estruturante Ltda; Dra. Cassia de Carvalho Fernandes; Dra. Lygia Maria Souza Ramos Firmani; e Dr. Fábio Barbalho Leite. Embora todos contestem as condições da contratação, a Representante Polimatas se insurge mais a respeito da “terceirização da função da advocacia pública; burla ao ingresso no serviço público por meio de concurso público; desvirtuamento da sociedade de advogados como agência de contratação de pessoal; superfaturamento do serviço; restrição de concorrência; e afronta ao acórdão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo”.
A Dra. Cassia de Carvalho Fernandes (TC-015122.989.23-9), por sua vez, oferece insurgências relacionadas à aglutinação indevida do objeto; à insuficiência das informações prestadas que influenciam na elaboração das propostas; às condições de participação; e à exigência de patrimônio líquido superior a 10% do valor estimado da contratação, .
A Dra. Lygia Maria Souza Ramos Firmani (TC-015126.989.23-5) crítica os seguintes aspectos da licitação: 1) Indisponibilidade do Edital e do Descumprimento do art. 21 da Lei nº 8.666/93; 2) Impossibilidade de contratação de empresa terceirizada para a execução de serviços advocatícios habituais; 3) Falta de critérios objetivos para avaliação da Técnica e Preço; 4) Utilização de maior peso para técnica do que para o preço sem justificativa; 5) Indevida exigência de regularidade fiscal perante a Fazenda Estadual; 6) Prazo de pagamento à Contratada em 30 (trinta) dias úteis; 7) Ausência de previsão de limite para reembolso das despesas da Contratada; 8) Ausência de aviso prévio em hipótese de rescisão unilateral do Contrato; 9) Exigência de autenticação de documentos; 10) Ausência de previsão de impugnação do edital por meio eletrônico; 11) Falta de especificação da exigência de índice contábil.
O Dr. Fábio Barbalho Leite (TC-015152.989.23-2) aponta a ausência de informações essenciais para formulação da proposta e execução contratual com relação a (i) quantitativos dos processos que serão assumidos pela contratada; (ii) condições de pagamentos e medições dos serviços; e (iii) pagamentos dos honorários sucumbenciais.
O BURACO MAIS EM BAIXO
A consultoria Polimatas Gestão Organizacional e Estruturante também ingressou na Promotoria de Caieiras com um pedido de instauração de Inquérito Civil Público contra o Edital TP nº 010/2023, com a alegação de que é nulo. Sustenta que o objeto da licitação representa ilegal TERCEIRIZAÇÃO da função da ADVOCACIA PÚBLICA, em razão de ser transferência de atividades internas e permanentes da Administração para terceiros, e ainda, transforma o Secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura em “Rainha da Inglaterra”, a ser o único contratado pelo Chefe do Executivo por cargo em comissão.
BURLA AO INGRESSO POR MEIO DE CONCURSO PÚBLICO:
Para as atividades internas e permanentes da Administração, há a necessidade de observância do art. 37, I e II da Constituição 7 e, assim, é preciso que essas atividades sejam prestadas por quem ocupa cargo ou emprego. Nesse certame impugnado, há verdadeira “porteira aberta” para exercício de procurador do Município ou assessor sem registro na OAB, por serem VINCULADOS à contratada, conforme consta do Edital.
DESVIRTUAMENTO DA SOCIEDADE DE ADVOGADOS :
Nessa formatação de prestação de serviço de advocacia, a exclusividade de contratação de sociedade de advogados é mero subterfúgio para indicações indevidas e, sobretudo caracteriza desvirtuamento da sociedade de advogados como agência de contratação de pessoal para cumprimento de jornada diária de trabalho como qualquer outro servidor da municipalidade que se exija sobrejornada. No caso, os contratados para fazer pareceres ou “orientações” do assessor jurídico sequer precisam de inscrição na OAB para essas tarefas, conforme cláusula 1.1.2 da minuta do contrato. Destarte, a sociedade de advogados figura apenas como uma agência de contratação de pessoal em mais uma burla à lei, por inefetividade do cumprimento de atividade da advocacia pública.
SUPERFATURAMENTO DO SERVIÇO:
O valor estimativo da contratação em tela se revela também superfaturado não só pelo escopo de seu objeto, que prevê a alocação de poucos advogados, mas, também, pela previsão de outros dispêndios a serem providos pelo Erário completamente indefinidos e incompatíveis com a dotação orçamentária da Secretaria de Assuntos Jurídicos do Município.
De um lado, a contratação pelo valor estimado R$1.428.000,00, ainda que seja prevista a modalidade preço e técnica, ESTÁ MUITO ACIMA do que hoje o Município dispende para ter iguais prestações nas exatas contratações para Contencioso Cível, Contencioso Trabalhista, Execução Fiscal e Tribunal de Contas, em razão de os atuais ocupantes terem proventos de R$6.628,98 (seis mil seiscentos e vinte e oito reais e noventa e oito centavos) cada um.
Em conta aritmética simples, ainda que se considere a disponibilização do dobro do mínimo previsto no Edital, ou seja, de 06 (seis) profissionais vinculados à sociedade de advogados, o custo anual seria de R$477.286,56 (quatrocentos e setenta e sete mil, duzentos e oitenta e seis reais e cinquenta e seis centavos), a exceder quase UM MILHÃO DE REAIS do valor estimado.
Do outro lado, além dos riscos de responsabilidade solidária trabalhista, não há qualquer limitação de despesas para cumprimento de prestação de serviço além dos 04 (quatro) expedientes mensais previstos na cláusula 25.3. da minuta de contrato e estipulado na cláusula 25.5.
RESTRIÇÃO DE CONCORRÊNCIA:
A levar em consideração a exclusividade de participação de sociedades de advogados nesta TP 010/2023, em que elas podem vincular qualquer profissional habilitado ou não com inscrição na OAB, além de se configurar mera agenciadora de mão de obra, o certame restringe a participação de escritórios de advocacia devidamente registrados na Ordem dos Advogados do Brasil.
De fato, além de sociedades de advogados, a OAB confere registro a escritórios de advocacia com advogado-chefe com mais de 3 (três) anos de inscrição na OAB, equipamentos e pessoal qualificado, com movimento e instalações adequadas, biblioteca com número mínimo de livros indispensáveis para consulta e uso no exercício de profissão, assinaturas de publicações em que divulgam leis federais, estaduais e os atos da Justiça local.
Em comparação com as regras do Edital da indigitada TP, o escritório de advocacia registrado na OAB tem melhor qualificação profissional do que a sociedade de advogados constituída HÁ MENOS DE UM ANO. Nesse comparativo, resta clara a restrição de participação na licitação e forte indício de que há direcionamento para contratação previamente acertada.
AFRONTA AO ACÓRDÃO DO ÓRGÃO ESPECIAL DO TJSP:
Atualmente, a Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Caieiras é composta somente por advogados contratados em cargo comissionados. Diante dessa composição desse órgão jurídico irregular e inapto, a douta Procuradoria-Geral de Justiça ajuizou, em 11/02/2021, Ação Direta de Inconstitucionalidade, Processo nº 2024880-90.2021.8.26.0000, em face de normas do Município de Caieiras relativas a cargos comissionados. Essa ADI foi julgada procedente com modulação efetivada no v. Acórdão com prazo para regularização da estrutura administrativa em “em razão da quantidade de normas impugnadas, seja fixado o prazo de 120 dias, a contar da data do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade, para que o Município tenha tempo hábil para reorganizar a ocupação dos cargos e tome as providências necessárias para adequação ao julgado”. Ao invés de cumprir o Acórdão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo dentro da legalidade e por meio procedimento de concurso público, a partir de garantia legal de vagas e orientado pelo princípio do art. 7º, XXX, da Constituição Federal, a SAJ lançou esse Edital eivado de vícios insanáveis.
DEMISSÕES EM MASSA:
Por erros administrativos como no caso dessa licitação, assistem-se hoje demissões em massa na Prefeitura de Caieiras ou reduções de salários dos servidores. Infelizmente, a opção de “dar um jeitinho” por soluções alternativas tem sido a regra jurídica aplicada pelo Chefe do Executivo municipal, em prejuízo das finanças públicas.