O PL 529/2020, de autoria do governador João Doria, é um duríssimo golpe à população paulista. Um verdadeiro pacote de retrocessos, travestido de ajuste fiscal para um suposto rombo de R$10 bilhões nas contas do Estado. Culpando a pandemia, o governador quer, com uma mesma canetada, extinguir dez autarquias e fundações públicas, demitir 5,6 mil servidores, cortar verbas das universidades e aumentar tributos.
De quebra, compromete serviços essenciais a quem mais precisa, de saúde, moradia, transporte, regularização fundiária, agricultura familiar e meio ambiente. Com essa temerária iniciativa, Doria conseguiu um feito histórico: uniu, contra si, partidos ideologicamente diversos, bem além das esquerdas. Ao lado do PT, as bancadas do PSL, PTB, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, PROS, Rede, Novo e Patriotas estão combatendo o PL 529.
Estamos indignados com a arrogância do governador, que reuniu assuntos tão díspares em um único projeto e tenta aprovação a toque de caixa, usando o artifício antidemocrático do relator especial – um resquício do regime militar, para realizar uma votação em caráter de urgência, sem passar pelas instâncias devidas. Cada um desses pontos deveria ser tratado separadamente na Assembleia Legislativa, com tempo hábil para discussão nas comissões e ajustes no texto.
Diante de tamanho absurdo, os deputados já apresentaram 623 emendas, todas vetadas: um recorde! O governador sequer demonstrou se a dívida existe de verdade e qual seu tamanho exato. A pandemia do coronavírus pode, sim, ter aumentado os gastos e diminuído a arrecadação do Estado, mas ess e é justamente o momento em que os 45 milhões de paulistas mais precisam de apoio, que o meio ambiente mais precisa de proteção, que a ciência mais precisa se desenvolver.
Eu, que batalho há mais de 30 anos pela Grande São Paulo, sei bem da importância de instituições metropolitanas, que ultrapassem os limites das cidades, com soluções conjuntas para diversos problemas. Era hora de se pensar em construir mais estruturas assim, e não de destruí-las. O PL 529 ameaça as habitações populares, os remédios gratuitos, a reabilitação de pacientes com câncer, o controle de endemias como a dengue, a conservação de recursos naturais, o transporte intermunicipal, a pesquisa brasileira. Parece que o governador foi lá, pegou uma dúzia de coisas que ele acha que somam o valor para equilibrar o orçamento, e disse: “vamos extinguir isso aqui”.
Além de nos oferecer um presente de trevas, Doria quer um futuro ainda pior para a população paulista. Empresas como a EMTU, a CDHU e o Oncocentro não são as vilãs dos gastos públicos - a economia gerada pelos cortes será irrisória, mas o impacto à população será tremendo.
Sorrateiramente, foi embutido também um aumento de tributos, como ITCMD, ICMS e IPVA, que sentiríamos diariamente. O projeto acaba até com a isenção de impostos para veículos de defi cientes físicos. Porém, não aborda uma revisão das renúncias fi scais concedidas a grandes empresas, que somam cerca de R$ 40 bilhões – o sufi ciente para cobrir o rombo, com sobra. Com quem o governador está preocupado, então? Doria quer mais do que uma política privatista.
Ele não vai vender as empresas públicas, vai simplesmente fechá-las, demitir os servidores e acabar com os serviços prestados. Na contramão da Constituição de 1988 e da democracia, quer retirar direitos sociais básicos da população, que tanto lutamos para conquistar nas últimas décadas. O já cansado discurso de “enxugar o Estado” é, claramente, uma manobra para extinguir instituições que o governador sempre atacou, abrindo espaço para sua estimada iniciativa privada e prejudicando a grande maioria da sociedade paulista.