Vamos conhecer mais um pouco das proezas da psique humana.
Este fato a seguir ocorreu na cidade de Caieiras em julho de 1986. Como envolveu
pessoas conhecidas da região, decidimos ser melhor usar pseudônimos
para evitar constrangimentos desnecessários.
Alceu, um ano e oito meses viúvo, esteve na casa de um antigo casal conhecido,
Gerson e sua esposa Zélia. Conversa vai e conversa vem, o Alceu ficou
sabendo que a Zélia freqüentava um centro espírita, isso,
sendo surpresa para ele. A Zélia enalteceu as qualidades mediúnicas
de uma jovem chamada Lia que morava no centro de Caieiras e convidou o Alceu
para conhecê-la. Ele titubeou um pouco, pois, não era dado ao espiritismo,
mas, concordou. No sábado seguinte, no carro dele os três rumaram
para a casa da Lia. Chegando lá, depois das apresentações,
o Alceu começou a especular a Lia sobre os “dons” que ela
possuía. Respondendo, ela informou-lhe que em outro Estado onde nasceu,
desde criança estava habituada a participar de reuniões espíritas
porque, seus pais tinham um “centro”. O Alceu logo pensou, “esta
mulher, desde criança deve ter recebido muitas sugestões”.
Por volta das quatorze horas teve início os “trabalhos”
na sala daquela casa da Lia e presentes estavam o Alceu, o Gerson, a Zélia,
a Lia, seu marido e seu filho, um garoto ainda. O Alceu estranhou o fato de
logo a Lia ficar “incorporada” porque, não viu aqueles costumeiros
estremeliques que antecedem uma incorporação. A Lia, ou melhor,
aquele que se dizia falar através dela, disse se chamar Eliomar e já
estava desencarnado há mil anos. O Alceu lhe fez algumas perguntas sobre
assuntos nada corriqueiros e se surpreendeu com as respostas certas que o Eliomar
lhe deu. Ele respondeu as perguntas com coerência, mas, de antemão
as respostas já eram sabidas pelo Alceu que fez as perguntas para testá-lo,
prevendo que, por si mesma, talvez, a Lia não estivesse à altura
de entender aquelas perguntas. Isso ele pensou. E o Eliomar continuou se explicando,
“enquanto eu estou aqui meus auxiliares espirituais estão visitando
todos os seus parentes para ver como está a sua situação”.
“Estranho” pensou o Alceu, “o que têm eles a ver com
a minha vida?”
O tempo foi passando e de repente a Zélia começou
a chorar. A Lia, ou melhor, o Eliomar falou para o Alceu: veja, é a tua
esposa chorando, ouça o que ela tem a lhe dizer. A voz não era
nada igual e nem tinha o mesmo sotaque de idioma misturado de quando sua esposa
era viva. E a Zélia choramingando foi falando, “eu sei que ele
tem uma namorada, mas, ele não pode abandonar os meus filhos, eles precisam
muito dele, não me importa que ele tenha outra, mas, ele não pode
deixar de cuidar dos filhos”. Gozado, a Zélia, isto é, a
“falecida”, ela não foi direta com o marido. Ao tratá-lo
de “ele” e não de “você”, pareceu mais
se dirigir aos demais do que ao marido ali em sua frente. O Alceu ficou surpreso
com aqueles assuntos jamais esperado por ele. Ele não foi na casa da
Lia para fazer alguma consulta. Como combinado, ele foi lá para ver os
“trabalhos” da Lia. Nunca havia pensado estar com aqueles problemas
de abandono dos filhos. Nem imaginou que aquela seção espírita
estivesse sendo para solucionar seus problemas, dos quais, causados pela falta
da esposa, sabia serem eles temporários e suas soluções
viriam com o passar do tempo, sem nenhum mistério.
Naquele sábado, aquela reunião demorou tanto
e o Alceu não compareceu para jogar futebol de salão, onde sempre
jogava das dezoito às vinte horas. Como era “necessário”
voltar mais duas vezes, isso ele fez sem o casal Gerson e Zélia, na sexta-feira
seguinte, à noite, para não perder o jogo de futebol no sábado.
Afinal, a Lia e o marido eram muitos simpáticos e com eles o tempo decorria
agradável. E assim a reunião espírita só teve a
participação de três pessoas, a Lia, o marido e o Alceu.
Deixando de lado os detalhes, o Eliomar incorporado na Lia repetiu o fato dele
ter desencarnado a mil anos e enquanto eles estavam ali, seus auxiliares invisíveis
estavam outra vez visitando os parentes do Alceu para averiguar como estava
sua situação. Terminada aquela reunião e aquele contato
auditivo com o espírito tão evoluído do Eliomar, o Alceu
retornou para casa por volta da uma hora da madrugada, portanto, já sendo
sábado. Leu num bilhete o seguinte recado: pai, assim que você
chegar, telefone para o tio, o seu irmão, é urgente.
Estranho, o que de incomum estaria acontecendo? Era raro receber
algum telefonema do irmão. O Alceu digitou os números do telefone
dele, mas, quem atendeu a chamada foi a sua cunhada.
---Oi, é o Alceu. Cheguei agora e tem um recado aqui para... O que foi?
---O que foi? O teu pai estava passando mal e foi internado.
---Sério? Como ele está?
---Muito mal, ele está em coma. Nada escuta e não reconhece ninguém.
Depois dessa rápida conversa, no silêncio da sua casa e com os
filhos dormindo, o Alceu, mesmo diante de uma circunstância que exigia
respeito, não conseguiu deixar de achar graça quando se lembrou
onde esteve e ouviu do Eliomar: “enquanto estamos aqui, meus auxiliares
espirituais estão visitando os seus parentes e voltarão para me
contar tudo o que virem a seu respeito”. O Alceu não teve como
evitar deixar de dar risada, pensando no porque o Eliomar não o avisou
que seu pai estava morrendo. Será que seus auxiliares haviam se perdido
e não encontrado os endereços onde residiam seus parentes? Força
de vontade eles tiveram, mas, coitados, aquela noite foi muito escura e eles
devem ter ficado com receio de encontrar algum espírito zombeteiro para
distraí-los de suas funções ou foram impedidos pelo “Caboclo
Trancarrua”, o terrível e temível.
Tudo é possível acontecer quando a psique humana,
mais evoluída, se transporta para o mundo imaterial e isso não
é para todos. Muitos não possuem a facilidade para esse acesso
transcendental porque, sofrem da doença chamada equilíbrio ou
“pé no chão” que, nenhum psiquiatra consegue curar.
Entretanto, vamos agora para as considerações do Alceu sobre esta
sua aventura. A Lia lhe pareceu ser sincera e acreditar no que fazia, isto é,
servir de invólucro para um espírito se introduzir nela e se manifestar
através dela. Quanto à realidade do fato, ela pode ser bem diferente
e a Lia não sendo criança ---talvez fosse--- deveria tentar descobrir
para não viver enganada e sem querer, enganar outros também. Naquela
época, ela não sabia que o Alceu já não era um “marinheiro
de primeira viagem”. Trabalhava em São Paulo e lá já
havia visto coisas “incomuns”. Já tinha participado de palestras
e reuniões com pessoas tidas como “evoluídas” nesse
“ramo” de “ciências ocultas”. Nunca se deixou
impressionar por nenhuma delas, porém, se divertiu e riu muito das tantas
imbecilidades que viu, ouviu e conheceu muita gente.