20/12/2023
Tempos felizes de molecagens

Tempos felizes de molecagens

No ano de 1948 no Bairro da Fábrica de Caieiras a meninada tinha toda a liberdade de brincar na rua e quase sempre as brincadeiras só iam terminar lá pelas dez horas da noite sob as luzes fracas dos postes que haviam. As meninas da vizinhança também participavam daquelas brincadeiras pueris. As brincadeiras tinham seus nomes, que, se citados hoje, como, piques, queimado, pula na mula, pular corda, cabra cega e etc. as crianças de agora nem iriam saber como tais brincadeiras eram. Naquele tempo era costume os meninos andarem descalços, menos as meninas. Por isso, quando se encerravam as brincadeiras de rua, que não eram asfaltadas, tínhamos que enfrentar as nossas mães que, nos obrigava a lavar os pés empoeirados na água fria do tanque de lavar roupas antes de irmos para a cama. Isso não era nada agradável (risos). 

Num dia daquele ano, nós os meninos recebemos uma “intimação”, tínhamos que nos matricular na escola local. Eu e o meu vizinho Zé Polatto tivemos que acatar o que nos era exigido e assim, nos matriculamos. Mas, tivemos algum receio por nada sabermos de como a escola seria para nós. Eu e Zé Polatto éramos vizinhos e sempre estávamos juntos nas nossas aventuras juvenis e às vezes alguns adultos do lugar vinham se queixar para os nossos pais de nossas travessuras, dar estilingadas nas galinhas deles, pisotear os seus canteiros de verduras, roubar frutas dos seus pomares, quebrar as lâmpadas dos postes com pedradas e etc. eu e o Zé nascemos no mesmo ano, e no mesmo mês de agosto, ele no dia dez e eu no dia doze, ele era mais velho que eu (risos).

Quando chegou o primeiro dia de aula na escola, um nervosismo chegou também. Era bom ter um amigo ao lado para se sentir mais à vontade e assim eu e o Zé nos sentamos numa mesma carteira. A professora do primeiro ano escolar se chamava Dona Maria Inês. Ela era gorda e logo começou a dar explicações do que queria dos alunos, bom comportamento, silêncio e etc. eu não entendi tudo o que ela queria porque o Zé que estava à minha direita no banco da carteira, ele começou a gemer, a se contorcer e me falava: Artino, Artino, eu tô apertado, tá doendo, eu preciso mijar. Fiquei meio perdido sem saber o que fazer. Fala para ela Zé. Não, fala você.
Ai, ai, ai, mas como, eu era gago e talvez não conseguisse falar. 

Daí fui investido de uma coragem sem saber de onde ela me veio e ficando de pé fui falando naquele nervosismo: Pro pro fe fe fessora, Do Do Dona Ma Ma Maria I I Inés, o Zé tá tá tá querendo mi mijá. A professora, então, falou: Menino, não se fala mijar, se fala urinar, entendeu? Mas, o seu amigo pode ir sim mesmo que não seja ainda a hora de recreio. Que alívio ela me entendeu e me virando para o Zé já sem nervosismo eu lhe disse sem gaguejar: Vai Zé, vai u r i n a r, aproveita então e de aquela puta mijada. E foi assim o meu primeiro dia de aula. Lembrando, esse ocorrido já foi contado no programa de rádio “Antiga Caieiras de Nossa Gente” que era levado ao ar pela antiga 96.5 FM às sextas-feiras a partir das vinte e duas horas.  

Porra Vô, que história legal, conseguiu passar muito bem a atmosfera daquele tempo, de quando você brincava na rua, tinha que ir pra casa lavar os pés, as brincadeiras que hoje nenhuma criança sabe como é, as suas aventuras quebrando poste com pedra kkkkkkkkkkk, muito bom, e o seu nervosismo para com a professora, e eu não sabia que você era gago, enfim, uma história muito legal

Altino Olimpio



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