Na estrada da vida
Os anos vão se passando e vamos nos despojando das inutilidades e das insignificâncias que ocuparam a nossa mente impedindo-a de ser contemplativa e participativa dos momentos em que eles poderiam ser de enlevo pelo prazer de poder e querer ter pensamentos mais significantes. Na idade do mais nada querer e do mais nada querer ter, me foi mantida a imaginação. Ela pode nos levar onde ela quiser.
E assim foi quando estive dirigindo um automóvel numa autoestrada. Com seus automóveis, pessoas mais apressadas passavam por mim. Mas, importava mais ver as paisagens enquanto as músicas orquestradas vindas do rádio do carro pareciam querer que eu me lembrasse do que eu tinha na memória, como fatos e pessoas de minha intimidade. Isso não quis porque insisti que meu pensamento deveria estar onde meu corpo estava, ao volante do carro. E me veio o pensamento de quem eu gostaria que estivesse ao meu lado no banco do carona... ... Ninguém. Todas as pessoas têm as suas idiossincrasias e muitas gostam de exteriorizá-las. Isso, impediria que eu, como queria, ficasse só com os meus pensamentos.
Na solidão daquela viagem e as vezes passando por dentro de várias cidades, eu nunca soube onde estava. Foi uma viagem sem rumo sem querer chegar a qualquer lugar. Às vezes parecia que ao invés do carro passar por cima da autoestrada era ela que passava por baixo dele, pois parecia que eu me encontrava num estado hipnótico quando estava sem pensamentos. Tudo o que eu via enquanto dirigia pela autoestrada me fascinava. As flores e as árvores do canteiro interminável que ficava entre as duas pistas de rodagem de ida e volta passavam rápido pelo lado esquerdo do carro paralisando os meus pensamentos para vê-las melhor como se elas estivessem desfilando para mostrarem as suas belezas.
Aquelas montanhas verdes e silenciosas com as suas imponências, com certeza tinham pássaros, animais e outras criaturas que conviviam com elas. Ah, os postes na beira da estrada suportando fios elétricos pareciam também que eram intermináveis com pássaros enfileirados descansando sobre os fios que eram sem choques para eles. Veículos apressados continuaram a passar por mim me fizeram pensar que estou sozinho neste mundo que é tão repleto de atratividades, as quais, ficam despercebidas por aqueles que vivem apenas preocupados com as suas responsabilidades e vivem como se não vivessem.
Viajando pela autoestrada que parecia infinda, vi uma vila de casas ao lado dela e a vila atraiu meus pensamentos. Se eu fosse jovem, com certeza iria imaginar que numa daquelas casas poderia morar a mulher dos meus sonhos. Seríamos apaixonados para sempre e viveríamos de carinhos sempre trocando carícias. Pensando em quem ou como seria ela eu nem ouvia mais o ronco do motor do carro, até que esse devaneio se desvaneceu substituído por outro que foi provocado por uma música que estava sendo tocada na rádio do carro, Luzes da Ribalta de Charlie Chaplin: “Vidas que se acabam a sorrir, luzes que se apagam nada mais, é sonhar em vão e tentar aos outros iludir, se o que se foi para nós não voltará jamais, para que chorar o que passou, lamentar perdidas ilusões...”
Essa música me fez ter um devaneio sobre o passado e por isso fiquei nostálgico. Interrompi o devaneio porque insisti em estar onde eu estava. Viajando de carro sem querer saber onde iria chegar. O sol já estava se escondendo e isso me fez rir, porque, parecia que eu também estava me escondendo do mundo e das pessoas com quem tenho relações amistosas, mas, nem tão amistosas assim (risos). Naquela viagem para não sei onde numa estrada sem fim eu quis me esquecer de tudo, quis ficar com o cérebro vazio de lembranças, boas ou não, que impedem de se viver no presente e quase consegui. Foi numa autoestrada que existe não sei onde, onde lembrei que “ter imaginação é como viver mil vidas numa só vida”.
Altino Olímpio