Dizem que o tempo voa. Deve ser verdade porque no bater de suas asas ele foi pra bem longe dos meus tempos de criança e da minha juventude. Daqueles tempos em que não me existia contratempos trago na memória aqueles fins de ano e aqueles inícios de anos novos. Eram mesmo impressionantes. Nos dias trinta e um de dezembro, nos bailes de réveillon quando os ponteiros dos relógios marcavam zero hora, todas as luzes do salão do baile eram apagadas por alguns segundos e quando as luzes reacendiam, os músicos da orquestra tocavam e todos cantavam “Adeus ano velho, feliz ano novo, que tudo se realize no ano que vai nascer, muito dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender...”. E os casais que estavam no salão entre si se abraçavam e se desejavam um próspero ano novo.
Se bem me lembro, também na zero hora entre o ano velho e o ano novo, se ouvia o apito da fábrica de papel antes do apagar das luzes por alguns segundos também nas casas dos funcionários da indústria daquele lugar donde pessoas simples e sem luxo moravam. Mas, logo que findava a madrugada do dia primeiro de janeiro e até mesmo antes de clarear o dia, os garotos já estavam indo de casa em casa desejando para os seus moradores aquele muito sincero e “Bom princípio de ano novo”. Por isso, eles ganhavam algum dinheiro. Essa frase era lucrativa. Eu e o meu vizinho e sempre amigo Zé Polatto (1942-2011) sabíamos disso. E nós solidários como éramos também participávamos desse costume tão nobre, o de exigir um feliz ano novo para as pessoas que estavam em suas casas. Eu e o Zé que tínhamos prática em preparar malvadezas para os outros, naqueles dias de bom principio nós nos esquecíamos delas.
A minha madrinha que morava numa casa a beira do rio e que se chamava Ditinha Valbuza e era esposa do Senhor Julio Valbuza, quando eu lhe desejava o bom princípio do ano novo, ela bem que caprichava no “donativo” que me dava. Naquela época em que ninguém gritava “pega ladrão”, eu e o Zé numa valentia que mais era ousadia, fomos desejar o bom principio de ano novo lá na casa donde morava o Senhor Hennig, que era o gerente geral da Indústria Melhoramentos de Papel. Ele por ter um olho de vidro, sem saber, tinha o apelido de caolho. A esposa dele é quem nos atendeu. Desejamos pra ela aquele bom principio, mas, ela não entendeu. Repetimos várias vezes e ela continuou não entendendo e por isso eu e o Zé caímos na risada. E aquela alemã quando nos falava nós também não entendíamos, sendo outro motivo para rirmos mais e mais. Pareceu mesmo que eu e o Zé de tanto rirmos debochamos daquela alemã que não nos entendia ou se fazia de desentendida porque, nenhum dinheiro nos deu. E esse foi o primeiro “mau princípio de ano novo” que tivemos.
Que saudade da felicidade que a ingenuidade daqueles tempos produzia. Ainda me “vejo” com o Zé perambulando por aquelas ruas, ambos descalços e de calça curta ainda sem pensar que a passagem dos anos iriam nos levar a perder aquela inocência e simplicidade de ser criança. Mas, aquela ingenuidade do “bom princípio do ano novo” lembrada aqui tem continuado por todos os anos em muitos que deixaram de ser crianças há muito tempo. Lembrando, existiam e continuam existindo as simpatias e as superstições para o início dos anos que são para trazer sorte. Parece que elas funcionam mesmo, pois, todos os anos elas são repetidas por gente iludida (risos). Interessante como a razão desaparece quando a superstição aparece e prevalece. Ainda existe simpatia de ano novo para que moças tenham a sorte de “arranjar” noivos? (risos).
Altino Olimpio