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27/04/2025
Esquizofrenia Unicamp descobre proteína

Pesquisa da Unicamp mostra como proteína pode influenciar surgimento da esquizofrenia.

Resultados foram publicados pela revista britânica Journal of Neurochemistry, em janeiro deste ano, e abrem portas para desenvolvimento de remédios mais eficazes.

Por Aline Nascimento*, g1 Campinas e Região

Pesquisa da Unicamp mostra como proteína pode influenciar surgimento da esquizofrenia — Uma pesquisa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revelou como uma proteína influencia a estabilidade da mielina, protagonista na transmissão dos impulsos nervosos. O estudo concluiu que a desregulação da molécula pode ter uma participação-chave no início da esquizofrenia.

Os resultados, publicados pela revista britânica Journal of Neurochemistry em janeiro deste ano, abrem portas para o desenvolvimento de remédios mais eficazes e capazes de devolver a qualidade de vida aos pacientes.

Em entrevista ao g1, Daniel Martins-de-Souza, professor de Instituto de Biologia (IB) e orientador da publicação, detalhou que o grupo percebeu que a proteína hnRNP A1, além de ser importante no processo de formação da bainha de mielina, está envolvida na manutenção da integridade da “cápsula” protetora dos neurônios. A desfunção da molécula pode desencadear o transtorno ainda na gestação.

A esquizofrenia é uma doença que, quando aparece na forma de sintomas, já é cronicamente estabelecida numa pessoa. A gente descobriu que tem uma proteína [hnRNP A1] que, aparentemente, tem potencial de estar atuando durante o início do desenvolvimento da doença — ou seja, no momento que a pessoa nem sintoma tem.

— Daniel Martins-de-Souza, co-autor da publicação

➡️ O que pode causar a esquizofrenia?

O cérebro é composto por dois tipos de células: os neurônios e as células de glia. Apesar de não terem a mesma fama, as células de glia desempenham diferentes funções no sistema nervoso.

Segundo o pesquisador, o transtorno seria desencadeado por uma falha no oligodendrócito, uma célula glia que comporta a proteína hnRNP A1 e carrega consigo a responsabilidade de fazer a bainha de mielina, uma estrutura composta por uma membrana que protege os neurônios.

🧠 Os axônios, a parte do neurônio equivalente a um “braço” que se liga a outro neurônio em uma sinapse, são envolvidos pela mielina, garantindo assim o seu bom funcionamento, e impedindo a perda na transmissão de impulsos de um neurônio a outro.

Caso os neurônios não estejam devidamente encapados, a transmissão de informações e comandos não acontece corretamente. Isso é o que ocorre na esquizofrenia.

As células da glia protegem e dão suporte aos neurônios —

➡️ Qual é a relação da proteína com a esquizofrenia?

O estudo mostrou que o hnRNP A1, que faz parte do oligodendrócito, tem o papel de regular o processamento do RNA mensageiro, ou seja, em ajustar como a bainha de mielina é cortada e montada, determinando quais proteínas serão produzidas e em quais quantidades.

A proteína já estava relacionada com a esquizofrenia em outras pesquisas feitas com tecido cerebral de humanos com o diagnóstico e com células cultivadas em laboratórios, mas os pesquisadores da Unicamp perceberam que a desregulação dessa proteína pode ter uma participação-chave no início do transtorno.

Há um consenso que a esquizofrenia é causada por um conjunto de anormalidade em várias proteínas, porém o professor ressalta que a hnRNP A1 “tem o potencial de estar já desregulada desde o início do neurodesenvolvimento”, e os seus estudos indicam que ela “parece ser uma das importantes” no desencadear da doença.

➡️ Essa descoberta pode trazer a cura da esquizofrenia?

Ainda não. Daniel esclarece que não existe um consenso entre psiquiatras e profissionais da área de saúde de que a esquizofrenia sequer é uma doença curável, ou se um dia qualquer medicamento ou tratamento poderá trazer a total remissão do quadro clínico.

O profissional ressalta que o foco da comunidade científica ainda é controlar a doença. “Das pessoas com esquizofrenia, metade delas não responde adequadamente aos tratamentos atualmente usados”, diz

Mesmo as pessoas que são tratadas e têm uma suposta boa resposta à medicação, nem todas elas conseguem voltar a trabalhar, a se relacionar adequadamente. O prejuízo cognitivo e das relações sociais é muito intenso numa pessoa com esquizofrenia — mesmo naquelas que recebem tratamento e supostamente respondem bem à medicação"

— Daniel Martins-de-Souza, co-autor da publicação

A elucidação do papel da hnRNP A1 no transtorno abre as portas para que novos medicamentos sejam criados. Os pesquisadores constataram que a molécula é essencial no momento em que os neurônios passam por mielinização, processo de produção da bainha de mielina.

“Essa proteína é um novo alvo e a gente agora tem que acertar nesse novo alvo para conseguir tratar melhor a doença”, explica o professor.

Todavia, o professor ressalta que o trabalho deles ainda é inicial, e que não vão surgir novas soluções clínicas imediatamente. “A gente está fornecendo evidências de onde é que nós temos que olhar para quando fomos desenvolver medicamentos”, diz.

Daniel Martins-de-Souza, pesquisador da Unicamp —

🤰🏼 Ainda na barriga da mãe

O estudo também fortalece a hipótese de que a esquizofrenia surge durante o neurodesenvolvimento em útero, quando o cérebro do feto está sendo formado. Nesse momento, algumas proteínas oligodendrócito (como a hnRNP A1) já apresentam a disfunção.

"Isso faz com que o cérebro não se desenvolva direito. E é justamente na época do final do neurodesenvolvimento da nossa vida que os sintomas emergem. O neurodesenvolvimento se dá até quase os 20 anos de idade, então, os pacientes com esquizofrenia justamente têm os sintomas aparecendo nessa fase da vida [entre 16 e 25 anos]", explica o professor.

Daniel também explicou que, além de olhar para as moléculas, os pesquisadores fizeram uma análise comportamental dos ratos participantes do estudo.

O grupo percebeu que, quando as alterações na célula ficavam evidentes e semelhantes ao que é encontrado em pacientes com esquizofrenia, notava-se que não havia uma mudança no comportamento dos animais.

"Ao passo que o neurodesenvolvimento não é adequado, os sintomas só aparecem na pessoa anos depois. Então, ou seja, a desregulação daquela proteína, ela vai, de certa maneira, silenciosamente, mudando a forma com a qual o cérebro vai se modulando, se moldando, sem que, necessariamente, os sintomas apareçam", relata o professor.

➡️ Como eles chegaram a esses resultados?

🔬 Os pesquisadores conseguiram chegar a essas conclusões por meio de experimentos com camundongos. Os testes tinham o objetivo de induzir uma neurodegeneração cerebral nos animais e estudaram o papel da hnRNP A1 no oligodendrócito a partir deste quadro.

Daniel explica que eles usaram um modelo de desmielinização, em que os camundongos perdiam a bainha de mielina, assim como os pacientes com esquizofrenia e outras doenças neurodegenerativas, como a esclerose múltipla.

Os animais eram alimentados com uma comida que tinha um composto chamado cuprizona, que atua promovendo a desmielinização dos neurônios.

Os camundongos vão perdendo a mielina, como acontece na esquizofrenia e em algumas doenças neurodegenerativas como esclerose múltipla.

Após essa perda, os pesquisadores interromperam o uso da cuprizona, e automaticamente a espécie retomou a mielinização.

Os pesquisadores injetaram no animal um composto que desfaz a hnRNP A1.

Quando a gente usa o inibidor, esses animais apresentam mudanças na bioquímica do cérebro, alinhadas com o que acontece na esquizofrenia. Ou seja, provavelmente na esquizofrenia, no momento que o cérebro tá sendo formado e mielinizando, essa proteína está disfuncional e faz com que o cérebro não se desenvolva adequadamente.

— Daniel Martins-de-Souza, co-autor da publicação "Impacts of hnRNP A1 Splicing Inhibition on the Brain Remyelination Proteome".


G1

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