25/09/2012
Tonico e Tinoco Inesquecíveis

Assim como eu, muitos dos caipiras brasileiros nasceram e cresceram ouvindo esta dupla sertaneja. Eles representaram a essência da simplicidade na alma sertaneja.

                Muitas lembranças me veem à mente quando paro para pensar e buscar nos meus memoráveis arquivos, da infância na roça, as doces lembranças da figura de meu pai e familiares próximos, cantarolando alguns versos de suas composições.

                Na escola rural, onde eu frequentava, cantávamos suas músicas todo final de expediente. Nas músicas: Dois Morenos e Tristeza do Jeca em parceria com meu colega Dirso, estufávamos muito as veias do pescoço, para agradar os colegas.

                Em casa, nossa principal diversão, era ouvir ao lado do meu querido velho, o programa “Na Beira da Tuia”, apresentado pela dupla, a partir das seis horas da tarde.

                 Nosso radio SEMP, apesar de toda sua rouquidão, nos proporcionava momentos de extrema felicidade, pois em cada música, havia uma nova história, um novo ensinamento e muito sentimento. Esta dupla fazia parte de nossa família. A viola cabocla do Tonico e o violão de pinho do Tinoco, afinadíssimos e estridentes, nos fazia viajar longe, através de seus acordes e versos simples, carregados de poesia.

                As músicas sertanejas de raiz trazem em seus versos, uma história com começo, meio e fim. Falam da nossa vida cotidiana, falam de amor e também de tragédia, mas falam com a pureza do coração, bem ao estilo do homem simples do interior.

                “Eu nasci naquela serra num ranchinho à beira chão, todo cheio de buraco, onde a lua faz clarão”. Mas, “não troco meu ranchinho amarradinho de cipó, por uma casa na cidade nem que seja bangaló”.  Há muito tempo não ouço mais o canto do inhambu, que alegrava nosso amanhecer e entardecer. “Este é o Brasil caboclo este é o meu sertão”, que “só me alegra quando pia lá praqueles cafundó. É o inhambu Chitão e o Chororó”...

                 Há quase um século, onde tudo era difícil,  os rádios eram raridades, e televisão nem em sonhos existia, estes dois caipiras de Pratânia, SP, de posse de dois rudimentares instrumentos - uma viola e um violão - com cordas de linha de pescar, iniciaram suas carreiras na arte de cantar e encantar.

                 Instrumentos estes advindos da troca com um índio, por quatro frangos caipiras, pelo seu pai. Movidos pelo desejo de se tornarem famosos, foram tentar a sorte em São Paulo.  Em setenta e cinco anos de carreira, ganharam o respeito e admiração de toda uma geração, além de terem o grande mérito de inspirarem e influenciarem uma legião de cantores sertanejos.  

                Trabalhando num ferro velho - Tonico e o outro carpindo quintal dos ricos – Tinoco, esperaram pacientemente, até o sucesso chegar, enquanto cantavam para amigos, quermesses e bares da capital. A determinação e a confiança em seus tacos foram decisivas para que isso acontecesse.

                Vejam só quantas peças esta vida nos prega. Numa de suas entrevistas recentes nosso querido Tinoco, afirmou que apesar de toda fama e gloria conquistada recebia como aposentadoria e direitos autorais um pouco mais de dois mil reais por mês.

                Com a mesma sinceridade dizia que para eles o que importava era levar alegria para todos os lares brasileiros. Cantavam por gosto mesmo, assim como faz a cigarra. Suas riquezas estavam guardadas em seus nobres sentimentos.  Apenas isso!

                 Sua passagem para a constelação da eternidade nos entristece, pois é o fim de uma era. A missão foi cumprida com louvor. “E lá no céeeu junto a Deus” seu irmão Tonico, o receberá em grande festa cantando a valsa “Saudade de Matão”.

                 Na sequência, a beira da tuia celestial se tornará mais caipira com: Chico Mineiro, Cabocla Tereza, Tristeza do Jeca e outras centenas que fizeram sucessos e passarão para a história, como pérolas musicais de uma época que passou.

                Cada música que se tornava sucesso, se transformava numa peça de teatro onde os mesmos eram os atores nos cirquinhos pobres do interior.  Feliz do homem, que no final de sua jornada, pode olhar no retrovisor do passado e ver seu próprio legado gravado nas mentes e corações de milhares de pessoas. “Todo velho já foi moço, todo moço foi criança, e nós vivemos da história do passado e da lembrança.”

                E VIVA A TONICO E TINOCO - A DUPLA CORAÇÃO DO “BRASIR”!

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Osvaldo Piccinin

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