“Amargurado pela dor de uma saudade, voltei de novo ao recanto onde nasci, onde passei minha bela mocidade, voltei chorando da saudade que senti”.
Que verdade cristalina e poética expressa este verso sertanejo. Somente uma alma cabocla para ter este nobre sentimento.
É muito comum encontrarmos pessoas que, apesar de se tornarem urbanos por opção ou obrigação, não tenham um pé na roça ou em cidadezinhas do interior perdidas por este Brasil afora. “A gente sai da roça, mas a roça nunca sai da gente”, nos persegue pela vida inteira.
Por incrível que pareça, as coisas que mais nos chateavam na época, são exatamente as que mais nos marcaram e nos remetem aos tempos da nossa infância perdida no tempo. Este final de semana fui matar a saudade do recanto onde nasci, lá no sítio Morro Azul. Passei um bom tempo recordando cada canto daquele paraíso, observando algumas árvores que plantei. Ainda está lá, quase morto, o abacateiro onde minha avó enterrou meu umbigo, como era costume da época na roça.
Que saudade do banho de rio, que saudade do pé de jabuticabas que durante o mês de
novembro nos presenteava com suas frutinhas pretas de uma doçura e sabor inigualável. Que saudade do canto estridente das cigarras nas tardes de primavera. Que saudade do pé manga rosa e manga espada, onde cada fruta madura era disputada à tapa pela molecada.
As amoreiras eram um show à parte. Disputávamos com os periquitos as frutinhas mais maduras. Que saudade das caçadas de estilingue, onde cada passarinho abatido tinha um valor diferente, de acordo com o grau de dificuldade para acertá-lo mortalmente.
Que saudade das brigas com os irmãos por causa de uma moela de galinha ou pelo maior bife. Saudade da horta sortida da minha avó, que além de verduras, tinha uma farmácia plantada: erva-doce, poejo, hortelã, erva-cidreira, losna, gengibre, erva de santa Maria, alecrim, guaco e outras mais. Saudade dos lugares onde eu armava arapuca para pegar pombas, rolinhas e inhambus para comer como “mistura” quando a gente enjoava de abobrinha e chuchu.
Carne bovina era artigo de luxo e frango só no Natal ou quando alguém ficava doente. Que saudade de andar na garupa do cavalo tordilho marchador - verdadeiro mimo de meu pai. Saudade de ouvir “a prosa” dos mais velhos na soleira da porta. Saudade das brincadeiras de pique e cantigas de roda no terreiro de casa. E põe saudade nisso!
Quanta saudade do tempo que passou, o tempo passa, mas em mim ficou, o sabor da infância e os calos da roça. Inesquecível é a dupla “Tonico e Tinoco”, no programa de rádio - “na beira da tulha”. Apesar da grande chiadeira do nosso aparelho Semp, era de longe o objeto mais valorizado lá de casa.
A música de abertura era sempre a mesma. “Eu nasci naquela serra, num ranchinho à beira chão, todo cheio de buraco, onde a lua faz clarão”. Na seqüência ouvíamos a novela “Jerônimo, o herói do sertão”. É na simplicidade que mora a felicidade!
“Adeus amigos e poço verde da esperança, meu tempinho de criança, que não volta nunca mais,
“Adeus manso regato que nascia lá na serra, saudosa fonte que alegrava o meu viver, adeus paisagem, céu azul da minha terra, rincão querido, hei de te amar até morrer”.
“Hoje ali só existe três coisas, que o tempo ainda não deu fim, a tapera velha desabada e a figueira sorrindo pra mim, e por último resta a saudade, do tempo bom que se foi, encostado embaixo da figueira, nosso velho carro de boi”.
Quem inventou a distância e o tempo não conhecia a “DOR DA SAUDADE”.
E VIVA A DOR DA SAUDADE!
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