O Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) da USP disponibiliza a partir desta terça-feira (1º/12) um teste capaz de diagnosticar a covid-19 pela saliva. O exame poderá ser feito inicialmente por moradores da capital paulista ao custo de R$ 90 – para quem for à instituição para a coleta da amostra de saliva – ou de R$ 150 – para quem optar por fazer a autocoleta e enviar a amostra para análise por um serviço de retirada e entrega disponibilizado pelo centro.
“Inicialmente realizaremos no máximo 90 testes por dia [por ordem de cadastro], cujos resultados serão disponibilizados em até 24 horas”, disse à Agência Fapesp a professora Maria Rita Passos-Bueno, pesquisadora do CEGH-CEL e coordenadora do projeto.
Para solicitar o teste é preciso fazer um cadastro no link disponível no site do CEGH-CEL, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), no Instituto de Biociências (IB) da USP.
O método é uma alternativa ao exame de RT-PCR, considerado o padrão-ouro para detectar o novo coronavírus durante a fase aguda da infecção, e similar aos já desenvolvidos no Brasil e em outros países com o objetivo de aumentar a disponibilidade e a rapidez e diminuir os custos para realização de testes moleculares por meio de simplificações dos processos. Segundo Maria Rita, o teste está de acordo com as diretrizes determinadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA) – agência regulamentadora de alimentos e fármacos – concedeu até o fim de agosto autorização para uso emergencial de cinco testes para diagnóstico de covid-19 baseados em saliva. Uma das autorizações foi para um teste chamado SalivaDirect, desenvolvido por pesquisadores da Universidade Yale.
No Brasil, o laboratório de genômica Mendelics criou e já comercializa um teste similar, e pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) estão desenvolvendo um kit na mesma linha.
“O teste que desenvolvemos tem algumas pequenas diferenças em comparação com os que têm sido comercializados no Brasil e nos Estados Unidos no que se refere aos reagentes utilizados”, afirma Maria Rita.
Teste piloto
O teste é baseado em uma técnica molecular amplamente utilizada para o diagnóstico de doenças infecciosas, como dengue, chikungunya, hepatite A e zika, chamada RT-LAMP (sigla em inglês de transcrição reversa seguida por amplificação isotérmica mediada por alça).
A técnica molecular tem algumas semelhanças com o método RT-PCR, que utiliza como amostras para realização dos testes secreções do fundo da garganta e do nariz. Em ambas as técnicas são induzidas reações para a realização de uma fase de transcrição reversa (RT), na qual o RNA do vírus é transformado em DNA, e uma fase de amplificação, em que regiões específicas do vírus são replicadas milhões de vezes para que o patógeno possa ser identificado.
Porém, o teste RT-LAMP desenvolvido no CEGH-CEL não requer a extração do RNA do vírus para ser detectado, o que é feito no RT-PCR por meio de reagentes importados, que são caros e frequentemente escassos no mercado, dependendo da demanda.
A eliminação da etapa de extração do RNA pelo teste de RT-LAMP é possível pelo rompimento do capsídeo do vírus por aquecimento e adição de uma solução desenvolvida pelos pesquisadores do CEGH-CEL, que estabiliza o vírus para os processos de conversão do RNA viral em DNA e para a amplificação do material genético do vírus para facilitar a detecção dele na saliva.
Todo esse processo ocorre em temperatura constante, por um método chamado amplificação isotérmica mediada por alça (LAMP, na sigla em inglês) (leia mais em agencia.fapesp.br/33998).
“Conseguimos desenvolver as enzimas necessárias para a realização desse processo, que são os principais insumos do teste, por meio de um trabalho desenvolvido pelo professor Shaker Chuck Farah, do Instituto de Química (IQ) da USP”, diz Maria Rita.
O teste foi realizado duas vezes por semana em 25 funcionários do IQ e 30 pessoas ligadas ao IB. O trabalho foi apoiado pela Fapesp e pela empresa JBS.
“Fizemos mais de mil testes com esse grupo de pessoas”, afirma Maria Rita.
Os interessados em realizar o teste devem se cadastrar pelo site www.genomacovid19.ib.usp.br. No formulário será possível escolher entre fazer a coleta presencial no CEGH-CEL (situado na Rua do Matão, travessa 13, no. 6, Cidade Universitária, Butantã, São Paulo) ou a autocoleta. As informações sobre a data e o horário disponíveis serão enviadas para o e-mail cadastrado.
Facilidade de coleta
Em junho deste ano, a professora Maria Rita foi uma das convidadas da live do Ciência USP O que dá para descobrir do coronavírus pela voz e saliva?, em que descreve o projeto em detalhes. Veja no vídeo abaixo:
Na live, ela destaca que uma das vantagens do teste feito por meio da saliva (o RT-LAMP) é a facilidade da coleta, que pode, inclusive, ser feita pela própria pessoa (autocoleta) e não necessita de equipe especializada, como no caso da coleta via swab, usado para os testes RT-PCR (em que uma espécie de cotonete com hastes longas é inserido no fundo das vias nasais e da garganta). Outra vantagem é o menor custo.
A live contou ainda com a participação da professora do IB Mayana Zatz, do professor Marcelo Finger, do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP, e da médica Anna Shafferman, da Faculdade de Medicina (FMUSP).
A professora Mayana Zatz destacou na live que, como cientistas, toda vez que surge um grande problema, eles se motivam no sentido de buscarem meios de ajudar e contribuir para o desenvolvimento de soluções, como esse teste via saliva – uma ideia da professora Maria Rita. Mayana contou ainda que o CEGH-CEL está muito interessado na parte genética da pandemia para entender por que algumas pessoas desenvolvem formas graves da covid-19 enquanto muitas outras apresentam as formas mais leves da doença.
No mês de julho, a professora Maria Rita também pôde falar sobre o teste feito por meio da saliva ao participar do podcast #Momento Tecnologia, em que descreve a tecnologia RT-LAMP (ouça no quadro ao lado)
Esse podcast também contou com a participação do professor Paulo Brandão, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), que falou sobre os testes RT-PCR.
Além do teste recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), chamado de RT-PCR, pesquisadores se mobilizam para desenvolver alternativas rápidas e eficientes que agilizem o diagnóstico do novo coronavírus
Elton Alisson, da Agência Fapesp, com edição do Jornal da USP. Leia o texto original aqui