O Ministério da Educação (MEC) definiu em R$ 4.420,55 o novo valor do piso salarial dos professores de escolas públicas. Um aumento de 14,95% com relação ao piso de 2022, que era de R$ 3.845,63. Quem paga são os estados e municípios.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) questiona a legalidade do aumento e orienta as prefeituras a não dar o reajuste. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), por outro lado, diz que o reajuste tem respaldo em lei.
Já o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), que reúne as secretarias estaduais, pondera que o aumento segue as mesmas regras desde a implementação legal do piso, mas aguarda uma solução legislativa definitiva do Congresso.
Mas, afinal, estados e municípios são obrigados a seguir o reajuste estabelecido pelo MEC? Entenda em 9 pontos como funciona o piso salarial dos professores e o que diz a lei.
1. O que é o piso e de quanto é o reajuste?
O piso salarial é o valor mínimo que determinada categoria profissional deve ganhar como remuneração.
No caso do magistério, é aplicável para profissionais que lecionam na rede pública de ensino e cumprem jornada de ao menos 40 horas semanais.
Com a atualização fixada pelo MEC, o piso dos professores de educação básica da rede pública passou de R$ 3.845,63 para R$ 4.420,55.
2. Quem paga o piso?
É pago pelas prefeituras e estados, a partir de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) repassados pela União, além da arrecadação de impostos.
3. O reajuste é obrigatório?
Sim. De acordo com uma lei de 2008, o reajuste no piso salarial de professores deve ser anual e, em tese, deveria ser seguido por estados e municípios. No entanto, nem sempre isso acontece.
O reajuste tampouco é automático. Mesmo com a publicação do aumento pelo MEC, cada estado e município precisa depois oficializar o novo valor por meio de uma portaria própria.
4. O que diz a lei sobre o piso salarial dos professores?
A lei 11.738, de 2008, determina que o piso salarial dos professores seja reajustado anualmente, no mês de janeiro. Os critérios para fixar o percentual remetem à lei do antigo Fundeb, de 2007.
O cálculo é com base no Valor Anual Mínimo por Aluno, montante definido pelo MEC que deve ser gasto por estudante dos anos iniciais do ensino fundamental. Esse valor por aluno tem sido fixado seguindo o que consta no antigo Fundeb.
Por exemplo: supondo que de 2021 para 2022 o gasto mínimo com um aluno do início do ensino fundamental tenha crescido 10%, estes mesmos 10% são aplicados para reajustar o piso do magistério.
5. Qual é a polêmica sobre o reajuste?
A polêmica é em torno dos critérios usados para definir o percentual de reajuste. Um novo Fundeb entrou em vigor em 2021 e, por essa razão, a CNM, entidade que representa os municípios, questiona as regras se basearem no Fundeb de 2007. (Leia mais abaixo.)
A CNM diz ainda que o critério utilizado não respeita a Emenda Constitucional 108/2020, que incluiu o art. 212-A na Constituição Federal, que diz que "lei específica disporá sobre o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério da educação básica pública."
O MEC defende haver "entendimento jurídico consolidado e vigente sobre a questão", garantindo respaldo técnico e jurídico aos critérios de reajuste.
6. O que dizem os especialistas?
De acordo com advogados ouvidos pelo g1, o reajuste não só é obrigatório e deve ser seguido por estados e municípios, como os critérios usados são válidos.
Para Salomão Ximenes, professor de Direito e Políticas Educacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC), a lei que determina o reajuste anual e a portaria do MEC fixando o novo valor já dão amparo legal suficiente para o aumento. Por essa razão, ele não vê margem jurídica que permita aos governos descumprirem a atualização do piso salarial.
Na prática, nenhum professor que seja funcionário da rede pública de ensino e trabalhe 40 horas por semana pode receber menos que R$ 4.420,55 como vencimento básico no holerite de janeiro.
— Salomão Ximenes, professor da UFABC
Para ele, mesmo com o novo Fundeb, a lei que trata do piso continua válida até que haja uma nova legislação que revise e altere as regras.
"Em nenhum momento a lei foi revogada. Portanto, as regras descritas nela permanecem com seu valor legal intacto", explica.
O advogado especializado em Direito Educacional e sócio do escritório Müller Martin Advogados, Célio Müller, também não vê ilegalidade no reajuste que justifique não ser seguido.
Segundo ele, o MEC cumpriu com suas atribuições como Poder Executivo, seguindo um cálculo previsto e regulamentado em lei, e cabe aos governos de instâncias inferiores cumprir.
Para ele, a preocupação dos municípios está na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas, mesmo assim, não se justifica.
O receio por parte de prefeitos e governadores é que o pagamento desse valor supere a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas nosso entendimento é que isso não a contraria e, portanto, não pode gerar penalidade. Consequentemente, não justifica o receio de cumprir o reajuste.
— Célio Müller, advogado especializado em Direito Educacional
7. Por que a entidade que representa os municípios questiona o reajuste?
A CNM argumenta que a atualização do piso não tem respaldo jurídico.
Segundo a entidade, a fórmula para determinar o reajuste está vinculada ao antigo Fundeb.
Para a CNM, o critério perdeu a validade a partir da entrada em vigor do novo Fundeb. Com isso, entende haver "um vácuo legislativo" e a necessidade da aprovação de uma nova legislação.
Ela defende que, na falta de uma legislação específica, os municípios devem conceder reajuste aos professores considerando a inflação de 2022 e as condições fiscais de cada cidade.
ue o critério para cálculo do aumento deveria seguir o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que ficou em 5,93% em dezembro.
Não é a primeira vez que a CNM questiona o reajuste. Em 2022, já havia feito isso ao criticar o reajuste de 33,24% anunciado pelo então presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, argumentou que isso poderia "complicar a situação fiscal dos municípios".
8. Qual é a opinião das secretarias estaduais de Educação?
O Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) entende que a fórmula de cálculo do reajuste anual do piso do magistério tem sido a mesma seguida desde a sua implementação legal.
A entidade diz ainda que acompanha as discussões sobre o assunto no Congresso Nacional e defende que os parlamentares deveriam aprovar uma "solução legislativa definitiva para a questão".
Ainda de acordo com o conselho, o "desafio para os próximos anos é garantir a manutenção e atualização do piso sem comprometer a sustentabilidade financeira dos entes, especialmente dos municípios".
9. O que dizem os representantes do professores?
Para a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o reajuste é, sim, legal. E, mais do que isso, constitucional.
A entidade argumenta que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar uma ação que questionava o reajuste com base nas regras do antigo Fundeb e pedia que os estados não fossem obrigados a segui-lo, considerou os critérios válidos e constitucionais.
A CNM está equivocada. O reajuste está respaldado na lei e cumpre uma conquista que tivemos em 2008 [com a aprovação da lei que instituiu o piso]. A confirmação [do reajuste] pelo ministro [da Educação, Camilo Santana] é importante para respeitar uma lei nacional e a conquista de uma categoria. Então, é inconsistente essa fala da CNM, além de ser desrespeitosa com professoras e professores do Brasil.
— Heleno Araújo, professor e presidente do CNTE