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18/11/2020
O lixo que nunca acaba

Cada paulistano produz cerca de 1,5 quilos de lixo por dia. O consumo e o descarte sem consciência fazem parte da rotina na capital. Mas para onde vai esse lixo? Como ele interfere na vida das pessoas?

O Aterro Sanitário da Unidade de Valorização Sustentável Essencis Caieiras, empresa do Grupo Solvi, localizado há 35 km do centro de São Paulo, recebe 2,4 milhões de toneladas de lixo por ano, sendo o maior receptor do estado, o ponto de descarte da capital, de Caieiras e de outras 16 cidades.

O aterro, que fica há apenas 200 metros dos bairros Jardim Marcelino e Vila dos Pinheiros ocupa uma área de cerca de 160 hectares, ou 1,6 km2 quadrado. Recentemente, teve autorizada sua ampliação vertical. Com isso, futuramente o lixo empilhado atingirá 140 metros de altura, o equivalente a um prédio de 45 andares.

O tamanho do Aterro Sanitário da Unidade de Valorização Sustentável Essencis Caieiras pode ser comparado à distância do bairro da Liberdade até quase a Luz e do Vale do Anhangabaú ao Parque Dom Pedro na Cidade de São Paulo.

Desvalorização e decepção

Ainda com o projeto de ampliação em andamento, moradores como a enfermeira Janaina Tomiye Yamakata Franco, 41 anos, residente no Jardim Marcelino há 15 anos, queixam-se do mal cheiro e do excesso de insetos. Segundo a enfermeira, o cheiro do gás é insuportável. “De madrugada, muitas vezes, a gente acorda com a boca seca, nariz ardendo por conta do cheiro desse gás. Ele é muito sufocante”, desabafa.

Um simples churrasco no quintal da casa da Janaina é impossível. “Aqui tem muita mosca. Eu tenho que por tela em todas as minhas portas e janelas para fazer comida. Aqui em casa, é tudo fechado. Se eu abrir uma janela, tenho que manter as telas. Se não tiver tela, não tem quem coma dentro de casa sossegado, sem estar lotado de moscas”.

Outro problema é a desvalorização dos imóveis do entorno e de áreas próximas onde o cheiro ainda é forte.

Janaina já tentou vender seu imóvel. “Não conseguimos o valor que a gente queria, que até estava mais baixo do que deveria ser, pela estrutura já construída e tudo o mais. Aqui, por ser fundão do Marcelino, bem próximo, muito rente ao aterro sanitário, a gente não é tão valorizado né?”

“Na realidade, me sinto muito triste”. Janaina lembra quando foi com a família ao Alpes de Caieiras, condomínio de alto padrão, arborizado, com lago, aves e animais silvestres. “Vi a estrutura muito diferenciada. É como se estivéssemos em outra cidade. A diferença é gritante. É muito desleal com a pessoa que mora aqui no Marcelino, vivendo, comendo e respirando esse ar tóxico. Eu sei que a culpa disso não é dos moradores, eles têm direito a aquilo. Com certeza, eles têm que ter mesmo. Mas eu acredito que nós, aqui, também merecemos ter valor em nossa região”.

O filho de Janaina visitando o aterro com a mãe, fez um vídeo falando como se sentia por morar perto do lixão. “Uma das coisas que ele falou, que doeu em mim como mãe foi: ‘eu não tô mais suportando este cheiro horrível que fica na minha casa. Meus amigos, quando eu era pequenininho, quando eu ia de perua, falavam que meu bairro fedia muito e eu não gostava disso. Eu pensava, por que a gente tem que viver neste fedor?’. Menosprezam quem mora aqui na região, e nós pagamos IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), temos a área toda construída, com planta, alvará, tudo certinho. Só que moro do lado do lixão. Para mim, isso é muito ruim, muito decepcionante.

Outro fator importante e até injusto é o valor do IPTU no local, que chega a ser o mesmo que em outros bairros do Município, quando não maior.


Isabela Bogajo - Estudante de Jornalismo