Quem semeia vento, colhe tempestade. Para falar das perspectivas de 2007, é preciso fazer pelo menos um breve balanço de 2006. Nesse caso, o ano passado foi traumático e muito pouco cultivado. As organizações criminosas revelaram a capacidade de sitiar a sociedade civil por seus instrumentos de associação política. Quer em São Paulo quer no Rio de Janeiro, o PCC e o CV estiveram a serviço de partidos, ora para sabotar eleições, ora para intimidar futuro governo, em troca de privilégios. A polícia de Lula tergiversou sobre os “aloprados”, para coroar o ano com o signo da impunidade. Mensaleiros, sanguessugueiros, fraudadores do Erário, todos foram colocados no saco dos protegidos da reeleição, como se o sufrágio eleitoral vitorioso fosse uma sentença absolutória dos crimes cometidos. A equipe econômica do governo federal foi incapaz de usufruir o excelente clima de crescimento mundial, a deixar uma valiosa oportunidade escapar por falta de uma opção clara de projeto econômico para o país. Complacência e anestesia foram as reações da sociedade desorganizada diante das barbáries cometidas contra o Brasil. A maioria pobre e desinformada foi complacente pelo consolo do bolsa família e, em alguns casos, porque obedecia ao crime organizado. A classe média, sufocada pela carga tributária e dificuldades financeiras, anestesiou-se e sublimou o Inferno, por falta de fé dantesca.
Diante dessa semeadura, 2007 promete mais do mesmo limbo: pouco investimento em infra-estrutura, associações criminosas, baixo crescimento econômico, educação rasteira, impunidade, fisiologismo político et cetera. Quem sabe a dilação de prazo concedida pelo povo a Lula não sirva para uma reversão dessa promessa? É que há uma clemente necessidade de se restituir a dignidade brasileira, sob pena de os poderes constituídos abrirem mais espaços para o crime organizado. Como dizia Padre Antonio Vieira: “Aquele que tem obrigação de impedir que se não furte, se o não impediu, fica obrigado a restituir o que se furtou. E até os príncipes, que por sua culpa deixarem crescer os ladrões, são obrigados à restituição, porquanto as rendas, com que os povos os servem e assistem, são como estipêndios instituídos e consignados por eles, para que os príncipes os guardem e mantenham em justiça.”
Para que não caiam no esquecimento, recordem:
Ferreira Gullar
Na Folha de São Paulo, “Muita gente se pergunta: eles são aloprados? Não, não são aloprados; são corruptos, são viciados em corrupção... É que eles não conseguem conter-se, como o escorpião que pica a jia, mesmo sabendo que vai afundar junto com ela. A corrupção é sua segunda natureza.
Procurador-Geral da República
"A organização criminosa ora denunciada era estruturada em núcleos específicos, cada um colaborando com o todo criminoso em busca de uma forma individualizada de contraprestação."
Pelo que já foi apurado até o momento, o núcleo principal da quadrilha era composto pelo ex Ministro José Dirceu, o ex tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, Delúbio Soares, o ex Secretário-Geral do Partido dos Trabalhadores, Sílvio Pereira, e o ex Presidente do Partido dos Trabalhadores, José Genoíno. Como dirigentes máximos, tanto do ponto de vista formal quanto material, do Partido dos Trabalhadores, os denunciados, em conluio com outros integrantes do Partido, estabeleceram um engenhoso esquema de desvio de recursos de órgãos públicos e de empresas estatais e também de concessões de benefícios diretos ou indiretos a particulares em troca de ajuda financeira.
O objetivo desse núcleo principal era negociar apoio político, pagar dívidas pretéritas do Partido e também custear gastos de campanha e outras despesas do PT e dos seus aliados.
Com efeito, todos os graves delitos que serão imputados aos denunciados ao longo da presente peça têm início com a vitória eleitoral de 2002 do Partido dos Trabalhadores no plano nacional e tiveram por objetivo principal no que concerne ao núcleo integrado por José Dirceu, Delúbio Soares, Sílvio Pereira e José Genoíno, garantir a continuidade do projeto de poder do Partido dos Trabalhadores mediante a compra de suporte político de outros Partidos Políticos e do financiamento futuro e pretérito (pagamento de dívidas) das suas próprias campanhas eleitorais."
Ministro Marco Aurélio de Melo
“Infelizmente, vivenciamos tempos muito estranhos, em que se tornou lugar-comum falar dos descalabros que, envolvendo a vida pública, infiltraram na população brasileira - composta, na maior parte, de gente ordeira e honesta - um misto de revolta, desprezo e até mesmo repugnância. São tantas e tão deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de escrúpulos que já não se pode cogitar somente de uma crise de valores, senão de um fosso moral e ético que parece dividir o País em dois segmentos estanques - o da corrupção, seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma ilimitada e duradoura, e o da grande massa comandada que, apesar do mau exemplo, esforça-se para sobreviver e progredir.
Não há, nessas afirmações - que lamento ter de lançar -, exagero algum de retórica. Não passa dia sem depararmos com manchete de escândalos. Tornou-se quase banal a notícia de indiciamento de autoridades dos diversos escalões não só por um crime, mas por vários, incluindo o de formação de quadrilha, como por último consignado em denúncia do Procurador-Geral da República, Doutor Antônio Fernando Barros e Silva de Souza. A rotina de desfaçatez e indignidade parece não ter limites, levando os já conformados cidadãos brasileiros a uma apatia cada vez mais surpreendente, como se tudo fosse muito natural e devesse ser assim mesmo; como se todos os homens públicos, nas mais diferentes épocas, fossem e tivessem sido igualmente desonestos, numa mistura indistinta de escárnio e afronta, e o erro passado justificasse os erros presentes.
Se, por um lado, tal conduta preocupa, porquanto é de analfabetos políticos que se alimentam os autoritarismos, de outro surge insofismável a solidez das instituições nacionais. O Brasil, de forma definitiva e consistente, decidiu pelo Estado Democrático de Direito. Não paira dúvida sobre a permanência do regime democrático. Inexiste, em horizonte próximo ou remoto, a possibilidade de retrocesso ou desordem institucional. De maneira adulta, confrontamo-nos com uma crise ética sem precedentes e dela haveremos de sair melhores e mais fortes. Em Medicina, "crise" traduz o momento que define a evolução da doença para a cura ou para a morte. Que saiamos dessa com invencíveis anticorpos contra a corrupção, principalmente a dos valores morais, sem a qual nenhuma outra subsiste.”
Almas Perfumadas (http://www.caieiraspress.com.br/livros/almas_perfumadas.php)
“- Só sei que este mundo está podre, como um dia minha mãe me disse com a lição de um poeta: Carlos Márcio Ulianov, você nasceu em uma sociedade que, se ainda não está morta, fede. Fede à bosta de regimento, fede a batinas de padres, fede a fábricas que lançam de suas chaminés a alma de seus operários, fede ao péssimo hálito de seus discursos, fede à adulação de seus elogios falsos, fede às mais imundas maquinações políticas, fede à cultura de universidade, fede a genocídio, fede a misérias, fede a torturas, fede a explosões, fede a pactos. Então, seja verdadeiro com você mesmo e perfume sua alma, senão vai acabar fedido.