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29/04/2016
Sou um vulcão


 Hoje seu despertar estava destinado a ser complexo.

Durante a fria madrugada, enquanto o mundo ocidental dormia, ele sentia, em estado de inconsciência dúbia, dentro de sua câmara magnalítica, uma inquietude insistente.
Uma grande águia, percebendo certa morbidez no ar que circundava seu fiel escudeiro, aproximou-se, e voando em círculos, tentou decifrar o que passava. Grunhiu suavemente mas com rigor de certeza, e questionou com muita cautela a dificuldade de seu amigo de jornada em se tardar à abrochar suas vendas noturnas.
Ele nada mais o olhou e num suspiro suspeito decidiu levantar-se, já que seria impossível angariar razões para se manter calado, afinal seu instinto crematório está em destruição dentro de seu âmago e um deslize causaria demasiadas cinzas a contaminar os ¨seus¨.
¨Sim, é inevitável, aqui estou"!
Já cogitando como entonaria sua voz para as muitas criaturas que o visitariam carregando seus fardos problemáticos a serem solucionados, muito angustiado pela decisão, resolveu que hoje esta voz deveria ser firme.
Um alebrije a quem conhecia já suas várias facetas, sobrevoou seu cume e numa intenção "quase inocente" lembrou-o de seu formato cônico e montanhoso deixando sua cauda levemente tocar sua crosta, enterando-o desnecessariamente de sua posição no mundo dos homens.
"Longe de mim indispor-me com sua boca bifurcada nesta manhã! Melhor não tivesse aparecido!” pensou ele.
Como quem vira uma página, dirigiu-se a seu cerne e ali esteve um breve tempo até a luz iluminar por completo o novo dia.
Mas não haveria sol, não este sol reluzente que aquece e acalenta os pedaços de gelo.
Desdenhando do que tentasse atingir sua inesgotável paciência, optou por estar entre o visível e o invisível. Não diria muitas palavras, nem tampouco convidaria ao cavaleiro dourado a entrar em seu mundo, só contestaria ao essencial e o infortúnio das demais questões estariam pendentes para outro momento onde o sol brilhante ofuscasse sua ferruginosa influência de outrora.
E assim fez-se para o agora!
A verdade é que não transformaria seus vapores acalorados do velho-ser numa lembrança latente em sua superfície. Seguro de que este fermento antigo já não servia para as obsidianas que buscava reluzir em seu momento real.
"Este magna fétido não ejetará em meu leite diário aerossóis que não servem para meu desejo fervoroso de um renascido "eu"!"
Relembrou, em um exercício desgastante, que surgiu dos limites destrutivos de incomensuráveis placas tectônicas mergulhados forçosamente nos breus de uma crosta, e então, sem muitos "senões, ou “se”, ou “nões" mandar "a la chingada" o que quer que o atormentasse.
“Vamos, seguirei caminhando mesmo sem pés, seguirei me movendo recheado com este ardido humor.
Pois, quem disse que tenho que ser ouro para seu olhar?
Quem disse que tenho que estar belo para ser aceitável?
Quem disse que para reluzir minha grandeza necessito amanhecer como um girassol todos os dias?
Sigo crescendo em antiguidade e em essência porque nada me transformou mais do que eu mesmo!
Sou um vulcão. Sempre serei.
Carpe diem!”

 

  Daniele de Cássia Rotundo