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28/02/2014
As arrueiras de Caieiras

As arrueiras de Caieiras

Por esse título acima qualquer um pode pensar que se trata de mulheres que não saem das ruas num viver despreocupado ou viver profano. Mas, não. A aroeira ou arrueira é um nome popular de uma árvore que pode trazer alguns inconvenientes para quem se aproxima de uma delas. Em Caieiras de quando eu era garoto e muito me embrenhava pelas matas para caçar passarinhos (idiotice juvenil) ou saborear frutos silvestres, ao passar por baixo dos galhos de uma dessas árvores sem reconhecê-la, a consequência era depois, o surgir de muitas feridinhas pelo corpo. E como coçavam. Existiam a aroeira brava e a aroeira mansa. Por essa distinção já se sabe qual delas provocava feridas nos sensíveis a ela, como eu. Os garotos de outrora melhor conviviam com as suas condições de serem crianças. A maioria deles tinha liberdade total para explorar as imediações de onde moravam. Muitas das árvores eles conheciam pelo nome e qual delas dava frutos. Qual das crianças de hoje saberia que “tuncum” era uma frutinha das matas? Crianças de agora vão pelas matas para colher morangos silvestres ou amoras? Passeiam livremente pelas beiras dos rios para pescar e saborear ingá das árvores dessa fruta?  Saberiam eles que a conhecida “pinha” vendida em quitandas ou supermercados antigamente se chamava ariticú? Criança de hoje construiriam uma cabana no meio de um canavial para na sombra chupar cana caiana? Os garotos de outrora às vezes construíam a cabana sem se importar quem fosse o dono do canavial. A cana comum não tinha nome e o nome de “caiana” eram para as canas mais grossas, gomos mais compridos e de mais sumo. Eram mais preferidas pela molecada. Nesta época sumiu o costume da molecada na reta de uma rua jogar futebol com bola de meia ou “rebatida”. Rebatida era quando não havia garotos suficientes para uma “pelada” e só havendo dois para brincar. Numa distância de mais ou menos vinte metros entre os dois garotos, cada um ficava num espaço entre duas pedras ao chão que representavam o gol. De “sempulo” um garoto chutava para o gol do outro que, sendo goleiro não podia deixar a bola passar por entre as pedras. Rebatidas eram melhor com bolas de meia e não com bolas de borracha. Qual criança desta época alguma vez viu no mato um lagarto em disparada “barulhando” em folhas secas abandonadas pelo chão? Alguma delas já viu morcegos de ponta cabeça dormindo dependurados nos galhos de uma árvore? Qual criança destes nossos tempos constrói “carrinhos de quatro rodas” para brincar nas longas descidas? No “meu tempo” às vezes se perdia a direção do carrinho e com ele batendo num barranco, no tranco um grande rasgo surgia na sola do pé ocasionado por um prego do carrinho. Era só sangue que esguichava e, como diziam que era bom, se urinava no rasgo ou corte sangrando. Naqueles tempos, mesmo com tantos desses “acidentes” nenhuma criança morria. Imaginemos hoje uma criança ao passar por baixo de uma arrueira e depois ficar toda “pipocada” de feridas pelo corpo. Para as mamães seria o fim do mundo. “Vamos levar ele ao pronto socorro. O que será isso? Vamos ao hospital. Temos plano de saúde”. Nada disso é preciso, porque, do mesmo modo que as feridinhas surgem provocadas pela arrueira, elas desaparecem sem qualquer tratamento. Comparando criança de agora com crianças de outrora vem à vontade de dizer: Não se fazem mais crianças como antigamente. Caieiras também teve seus tempos áureos quando as crianças eram mais crianças por causa da maior convivência entre elas nos seus folguedos inesquecíveis, embora, sejam esquecíveis hoje. 

                                                                                                      Altino Olympio