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23/07/2012
A verdadeira face da aposentadoria

Um dia disseram que ao me aposentar, eu entraria em depressão. No início estranhei me vendo  longe de atividades que, por mais de 30 anos, dominaram meus dias, como levantar cedo e  sair sempre  correndo por causa de horários e compromissos. Nos primeiros meses, em casa, limpei  armários, gavetas e tudo que nunca  se faz por falta de tempo. Depois tentei  trabalhar  em outra empresa, em  outra área. Meses depois, fui fazer aulas de artesanato, de dança, de  pilates, caminhadas etc. Seguindo sugestões de amigas, fiz viagens e passeios de excursão. Entrei  para o clube da terceira idade, joguei bingo e até  conversa fora.  Comprei livros, revistas, palavras cruzadas. Fui a shoppings, cinema e um  pouco mais, movida pelo pavor de cair no marasmo e  na mesmice doméstica que nos  “emburrece”  lentamente. E  temendo a  depressão anunciada, inconscientemente,  acabei mantendo o mesmo ritmo agitado e ansioso de sempre.
Num belo dia, enjoei de tudo e um pouco  de racionalização  me fez mudar de comportamento. Optei por diminuir o ritmo doméstico  ingrato e escravizante. Reorganizei- me    e  descobri  coisas fantásticas.  Descobri por exemplo que  a internet pode ser uma boa aliada, se usada com lucidez.  Nela  se encontra os mais variados e   infinitos assuntos que, de alguma forma,  aprimoraram  o intelecto .Descobri pessoas. Fiz amizades e através de duas   (Altino Olímpio e Edson Navarro),   comecei a escrever para este jornal, liberando  assim  meu poder criativo já bem  adormecido.  Fiz novos amigos, reencontrei outros e magicamente, um universo maravilhoso se escancarou à minha frente me tornando imensamente feliz.
Entendi  então que, aposentar é  bom e que, agitação demais  pode ser sinônimo de angústia. Entendi  que parar de trabalhar é o mesmo que    abandonar  um ringue que, só machuca e sufoca. Melhor, é  estar no palco que realiza e liberta. Descobri  como é  desgastante   ter que prestar contas sempre, atingir metas, suportar pressões. Descobri como é  penoso conviver com     inimigos, antipatizantes e sugadores da  energia alheia. Descobri como é mais gratificante  ter   amigos verdadeiros, companheiros, leais e compartilhantes  . Descobri  que é bem mais saudável não ter  que  engolir sapos ou se atracar com leões para se provar capacidade. Descobri que em certa  altura da vida, dificilmente se enriquece e que por isso deve-se exercitar para gastar o necessário. Com sabedoria e  bom senso comprar passa a ser secundário. De onde  se conclui que, para  ser feliz basta pouco. Basta o essencial, o invisível, o simples e o descomplicado.
Descobri em tempo que, a  meta perfeita  é a de viver bem, distante do ringue e da competição sufocante. O sonho maior  é ter saúde, nem que seja com doses homeopáticas de ociosidade. Não fazer nada de vez em quando  também  é  terapêutico, proporciona bem estar, relaxamento e incentiva a reflexão .
Para concluir, ante suposições, indagações e constatações, aposentar  na realidade, nada mais é do que prosseguir  com passos mais lentos, acordar preguiçosamente,  e fazer só o que se tem vontade. É usar o relógio como adorno. É viver cada dia sem grandes turbulências, reaprendendo a olhar o mundo com mais carinho  e atenção, aceitando amigavelmente   a rotina  boa da  quietude.
E não vale sentir culpa! No palco da vida, vale de fato, os aplausos e  uma  auto reverencia  por todas as conquistas,  tolerância e sensatez  em  abandonar o ringue no momento certo. 
A sensação de missão cumprida, deve  então  ser saboreada com uma pitada de orgulho já que a condecoração,  mesmo que  subjetiva,  terá seu peso em ouro e se transformará  numa âncora emocional eterna, dando continuidade para uma nova  etapa de vida.

                                                            FATIMA CHIATI

Comentários:

Fátima, como você é cada vez mais lida neste Jornal, com centenas de acesso  na sua página, só tenho a dizer: Viva a Aposentadoria. Continue. Edson

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 Que belo texto este da Fatima sobre a aposentadoria. Ela demonstra que sabe usar o seu discernimento, embora muitos não o saibam. Aposentar tem a ver com o "agora vou viver como quero e não como querem os outros". Muitos, parece mesmo, que, desaprenderam a viver "consigos mesmos" e por isso estão despreparados para a aposentadoria. Aquele "não tenho o que fazer, não aguento mais só ficar em casa e etc" são os queixumes de muitos. A Fatima "se encontrou" porque encontrou como passar o tempo (risos), embora, muitos aposentados ainda não encontraram. No texto ela citou dois nomes, o meu e o do Edson Navarro como nós sendo o prazer de nos ter conhecido. Isso é recíproco e nos envaidece.

Altino Olympio

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Gostei muito de sua crônica.

 

Bem diferente daquelas que apregoam que "quem se aposenta logo morre..."
A aposentadoria requer realmente imaginação. Um hobby faz as coisas ainda
melhores.  Nilson

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Fátima Chiati