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09/05/2012
Bar do trinta

Em toda cidade brasileira, existem pessoas e lugares folclóricos, principalmente bares. Na minha existia um bastante famoso - O Bar do compadre Salvador Trinta. Tratava-se de um senhor com estatura mediana, pouca conversa e muito calmo. Suas sobrancelhas espessas, chinelos de alpargatas marrons e a cintura da calça sempre posicionada bem acima do umbigo - era sua marca registrada e lhe conferiam a imagem de um ser humano diferente, principalmente pela sua paciência “Franciscana”.
O local era ideal para rever amigos, tomar tragos, fazer negócios  principalmente as famosas barganhas de animais de lida – cavalos, éguas, burros, mulas etc. Também se trocavam bicicletas, armas de fogo, relógios etc.
Nos finais de semana o bar ficava lotado. Vinha gente de todo canto, principalmente dos sítios e fazendas vizinhos, para fazerem as compras da semana.  Era um bar simples, mas bastante aconchegante. Em seu enorme quintal ficavam uma latrina e vários “amarradores” de cavalos, pois era ali onde se faziam o comercio destes animais e de outros produtos.
  Num dos cômodos ficava o “Reservado”. No centro deste salão havia uma grande mesa comunitária, pois ali se sentava quem quisesse, sem pedir licença. Principalmente para saborear um delicioso e inesquecível sanduíche de mortadela com celofane e tudo, acompanhado, claro, de uma tubaína quente, porque geladeira - nem pensar. Que saudade das bolinhas de gás que se formavam no copo e explodiam no rosto enquanto bebíamos o refrigerante!
Por lá desfilavam os bêbados mais famosos da cidade, bem como os contadores de “causos”, os mentirosos e os seresteiros famosos como o saudoso “Mané” Lopes que nos fazia sonhar dedilhando belas canções clássicas, em seu plangente violão - Abismo de Rosas era a mais pedida. E ai de quem desse um pio enquanto ele tocava!
Nesta época a cidade era tranqüila e havia poucas brigas e crimes. Tinha uma única Cadeia, por sinal, muito pequena, usada na maioria das vezes como depósito de bêbados e alguns fanfarrões mais exaltados. O preso não passava mais que uma noite no xadrez - tempo suficiente para se recompor do porre - não sem antes levar uma boa surra, principalmente os reincidentes.
O único soldado existente chama-se Pedrão que portava na cintura um velho revolver e um cacetete de borracha. Este por sinal, usado com muita freqüência. Fazia a ronda a pé ou de bicicleta Philips já que não havia viatura motorizada.
O Bar do Trinta tinha uma peculiaridade típica das cidades do interior. Como todo mundo se conhecia, as compras do mês eram anotadas numa caderneta com o nome do freguês, estas ficavam guardadas numa gaveta do surrado balcão e pagas religiosamente todos os finais de mês – dar o calote jamais!
O proprietário era amigo dos fregueses e na maioria das vezes padrinho de batismo de seus filhos. A passagem mais pitoresca era ver o nosso bravo soldado chegando de mansinho para dar um flagra nos bêbados que passavam do limite. Por falta de camburão, os “bebuns” eram levados para a Delegacia numa carroça fretada do não menos folclórico e espalhafatoso cearense, Zé Antonio Soares. Quando não davam conta de subirem sozinhos na condução “movida à capim”, os mesmos eram colocados pelo fundilho da calça. Eram levados de dois a três numa única viagem.
Boa época aquela onde o tempo era preguiçoso e demorava a passar. As ruas não tinham asfalto. Não tínhamos carros, nem televisão e nos divertíamos com pouca coisa. Nos finais de semana, o Bar do Trinta se transformava num teatro a céu aberto – e que espetáculo!
Ao Salvador, homem de alma pura, totalmente desprovido de vaidades que há muitos anos já se foi, deixo registrado meu carinho e o testemunho que você escreveu uma página importante na história de nossa cidade e no coração daqueles que lhe foram caros.
E VIVA A PÁTRIA! [email protected]


Osvaldo Piccinin