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08/05/2012
A varanda da fazenda limão doce !!!!!

“Dizem que existe um mundo tão bonito lá fora, que nem em sonhos eu vi, o que me importa este mundo lá fora se o meu mundo é aqui”. Estes eram os dizeres numa prancha de madeira fixada acima do barril de carvalho, situado na varanda, contendo cem litros de cachaça artesanal - fabricada na própria fazenda. Aguardente Sinhazinha era o nome.

                A fazenda Limão Doce, localizada no estado do Espírito Santo, era uma referência de gestão na região. Ali além do rebanho de trezentas vacas Girolanda, de apurada genética, onde se produzia ao redor de seis mil litros de leite por dia, também havia uma plantação de café com aproximadamente duzentos mil pés, manejado com acuidade através das melhores práticas agronômicas.

                Tudo ali funcionava bem. Sua gestão, apesar de simples, continha sabedoria e uma forte liderança do proprietário, conhecido por DR. Lazinho. Engenheiro agrônomo por formação e produtor rural por paixão, nos dizia.

                De ascendência mineira apreciava uma boa prosa, uma comida caipira feita em panela de ferro no fogão à lenha, além daquela cachacinha antes das refeições. Disso ele não abria mão! Todas as vezes que eu visitava aquela região, como agrônomo, fazia questão de visita-lo, de preferência, bem perto do almoço ou do jantar. E a prosa rendia horas a fio.             Antes da sagrada cachaça apanhava um fiapo de linguiça caseira, já defumada, pendurada num varal em cima do charmoso fogão à lenha bem no meio da cozinha e nos servia como tira gosto.

                Sua cozinheira, Maria das Dores, era craque numa galinha caipira com quiabo, numa rabada, ou na sua especialidade – leitão à pururuca. Este por ser mais demorado, era preparado uma vez a cada quinze dias. Foram poucas vezes que acertei na mosca o dia que era servido. Acompanhado de polenta na tábua e uma salda de almeirão colhida na hora em sua sortida horta.

                A casa da sede, no estilo colonial, era enorme. Seus batentes e portas de cabriúva, piso de ipê e telhas antigas lhe conferia um ar aristocrático da época do Brasil colônia - nos tempos áureos do café. Sua varanda enorme, com vários ninhos de pássaros em seus pilares de madeira nobre, nos dava a impressão de estarmos num viveiro a céu aberto. Os piolhos das aves nos atazanavam, mas o show compensava o incômodo. Pássaros Pretos faziam verdadeira sinfonia com seus cantos estridentes e afinadíssimos, logo após nosso preguiçoso e espichado almoço. Uma sesteada de meia hora na rede era de lei.

                Dr. Lazinho não gostava de se ausentar por longo tempo de seu paraíso. Era partidário do ditado: “os olhos do dono que engordam o porco”! Também dizia que as plantações e seus animais se entristeciam quando viajava. Lia muito, assistia todos os noticiários pelo radio já que televisão ainda não havia chegado por lá. Estes atributos lhe conferiam grande sabedoria e liderança na região.

                Quando lhe perguntei qual o segredo do seu sucesso, ele, após uma longa e proposital respirada me disse: - aqui nesta varanda onde estamos sentados, sentaram também meu avô e meu pai. Nesta fazenda eu nasci e fui criado, ausentando apenas na época dos estudos. Aqui aprendi com eles coisas que carrego pela vida afora e passo também para meus descendentes. Não gosto muito de falar sobre este assunto para não parecer presunçoso, mas como você é de casa vamos enfrente.

                Aprendi que a humildade e a educação cabem em qualquer lugar. Aprendi que para ser feliz, o que se conta é fazer aquilo que gostamos e com amor, não aquilo que dá mais dinheiro.         Aprendi que as coisas, por mais complicadas que sejam, precisam ser resolvidas no diálogo e não no grito. Até os animais quando tratados com carinho se tornam dóceis.

                Aprendi que o homem precisa dormir cedo e acordar cedo, assim o dia renderá mais.  Aprendi que quem dorme cansado não tem insônia. Aprendi que a gente precisa comer coisas que dão em árvores, e produtos de animais saudáveis e sem estresse. Aprendi que ninguém é o dono da verdade.        Aprendi que todos nós somos passíveis de erros e merecemos uma segunda chance. Aprendi a respeitar e a dar uma vida digna aos funcionários que me ajudam a alcançar sucesso, com lealdade e dedicação. Aprendi que quando não temos coisas boas para falar das pessoas, das ruins devemos nos calar. Aprendi que a velhice só tem duas coisas boas: a experiência e a paciência, o resto é o resto.

                Quando terminou sua lição na varanda percebi que estava na hora de partir. Ele me acompanhou até a porteira em silencio e na despedida me disse: o mundo está nas mãos daqueles que tem coragem de sonhar... E de correr o risco para viver os seus sonhos. Disse-me mais: - desconheço o autor dessa frase, mas acredito muito nela: “o dinheiro faz homens ricos; o conhecimento faz homens sábios e a humildade faz homens grandiosos”.

           E VIVA A SABEDORIA DA VARANDA

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Osvaldo Piccinin