Também tenho histórias
Quando leio neste jornal as crônicas contidas na coluna “Caieiras Antiga” o presente desaparece e me “vejo” no passado. Vi-me em todos os lugares que a Fátima Chiati tão bem descreveu em “O salão nobre da fábrica”. O outro cronista tem acusado minha existência por eu ser o irmão do Bauru como se sem ele eu não existisse. Talvez já esteja velho e com a memória confusa porque naquela crônica sobre os calouros ele citou o meu nome, o do Renato Marchesini e do Fred Assoni como se nós também tivéssemos cantado naqueles programas. Isso é invenção dele. Mas, lendo essas crônicas, muitos fatos pensados esquecidos reaparecem em minha memória. Onde nasci e morei, a maquininha já citada várias vezes nesta coluna do jornal, na longa curva ao passar defronte algumas casas antigas (disto originou o nome Bairro da Curva), ela com seus vagões, de passageiros ou de carga, rangiam alto pelo atrito das rodas com os trilhos. Isso incomodava meu pai, Lucio Rodrigues que, quando trabalhava na fábrica de papel no turno da noite precisava dormir durante o dia e com tanto ruído a maquininha o acordava. Meu pai foi colega de trabalho do Alberto Olimpio, pai do cronista confuso. Eram operadores do “cilindro da máquina cinco”. Local este onde eram preparadas as massas para o fabrico de papel. Encanadas e pelo efeito da gravidade as massas iam desembocar na máquina de papel número cinco. Agora voltando à maquininha, o problema não era só o barulho. Aquela curva era local de frequentes acidentes. Lá era onde mais ela descarrilhava. Devido a isso decidiram mudar o trajeto da maquininha para o morro detrás do Bairro da Curva. Escavadeiras, tratores e caminhões foram à atração da meninada naqueles dias da escavação. Esta fez com que o morro ficasse dividido em dois por um corte entre eles tendo a largura adequada para a instalação dos trilhos do novo trajeto da maquininha. O local ficou sendo chamado de “o corte da curva”, embora, fosse sem curva. Fora engenhoso para evitar acidentes, mas, foi “palco” de um. Duas composições de carga lá se chocaram quando um vagão de transporte de celulose ficou todo retorcido. A comprovação disso está numa foto tirada pelo conhecido Gildo Bertollo, que, além de funcionário da indústria local também era barbeiro e nas horas de laser era fotografo amador. O Gildo fotografou uma falha humana. Existia uma comunicação entre a estação da maquininha do Bairro da Fábrica e a estaçãozinha do Bairro da Cerâmica. Alguém liberou uma das composições quando a outra já estava trafegando pelos mesmos trilhos entre as estações citadas. Se alguém foi punido por isso, tal falha deve ter sido “abafada”, pois, seria do conhecimento geral. Naquele lugar era só alguém soltar um pum que todos ficavam sabendo. Contudo, tudo acabou. Não na memória agora meio turva onde ainda “vejo” o Bairro da Curva e o “corte da curva” sendo as retas das minhas lembranças sobre a minha infância e juventude.
Nilson Rodrigues