17/05/2008Um raro retôrno
Estou em Caieiras, no Bairro da Fábrica e no páteo cimentado da Capela de São José. Ladeada por altos eucaliptos ela está à minhas costas e daqui deste lugar mais alto do bairro estou vendo os telhados da indústria de papel. À minha direita ainda existem algumas moradias. Na seqüência e abaixo delas, o que eram o Bairro Chic, Vila Pereira, Vila Nova, não mais existem. Nasci neste lugar há muito tempo e aqui estou distraído imbuído nas recordações. É como se estivesse vendo os amiguinhos em suas brincadeiras e mesmo ouvindo seus alaridos de alegria rotineira brincando de pula na mula, pulando corda, batendo peteca, meninas pulando amarelinha, meninos empinando papagaio no morro, rodando arco, meninos e meninas brincando de roda, cabra cega, cirandinha, queimado, piques, garotos tirando um racha com bola de meia, jogo de taco de derrubar casinha, outros nos jogos de botão, rodando pião, iô-iô, brincando de escravos de Jô, outros jogando biroque ou birole com bolinhas de gude perto de alguns jogando moedas numa caixa de fósforos no jogo de caxeta, outros construindo cabana na mata, caçando passarinho, catando minhoca para pescar. Pareço ouvir os ruídos dos carrinhos de madeira de quatro rodas disparados pelas descidas das ruas de terra enquanto alguns se inebriam com os coloridos das bolinhas de sabão que assopram pelo ar. Choveu muito e eu aqui no páteo da Capela de São José. Quando por aqui acontecia uma forte “chuva de pedra” nós crianças depois dela se acalmar catávamos pedras de gelo para comer com açúcar. As poças d’água espelhavam o céu, as nuvens e até a felicidade de nossos rostos. A natureza só era beleza num reinado sem indelicadeza. Naquele tempo se tinha tempo de acompanhar as piruetas das borboletas e nos amores por suas cores. Nós fomos crianças sapecas enquanto as meninas brincavam com bonecas. Os adultos trabalhavam e nós tínhamos a escola para ficarmos cultos. Neste lugar longe de confusão a primeira televisão foi comprada pelo Senhor Américo Zanon, pioneiro nessa decisão. Depois foram surgindo os automóveis na transitoriedade provocada entre as amizades e de quando tudo acabou sou apenas mais que se dispersou. Reina silêncio aqui na Capela de São José. Aqui foi bonito o mundo onde tudo de bom foi fecundo e neste nosso agora só nos resta a lembrança de outrora. Fim da tarde e já quase início da noite, logo a escuridão será o silêncio entre os eucaliptos e a capela e tudo parecendo palco para uma triste novela cujos capítulos são existentes dentro daqueles que foram minha gente daqui deste lugar onde sobrou à mata, as estrelas, o sol e o luar.
Altino Olympio