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31/10/2013
A piscina dos alemães


A piscina dos alemães

Você vem comigo para um recanto da natureza e não vai se arrepender. Aqui é o Bairro da Fábrica de Papel de Caieiras. Um pedacinho do universo onde todos habitantes são irmanados. Esta ruazinha estreita com casas de ambos os lados tem o nome de Bairro Chique. Aqui à direita por trás desse muro alto está o grupo escolar. Lembranças de quando garoto me ressurge agora. Estou-me “vendo” de calça curta na hora do recreio comendo sanduíche de pão com ovo frito e com os pés descalços como era costume dos meninos da época. Continuemos andando olhando para as casas da esquerda e da direita. Conheço todos que moram por aqui. Pais, filhos e avós. Até sei de quem já é de quem. Agora, aqui depois da última casa temos este caminho estreito de areias finas e claras com matas altas à direita e à esquerda matas mais baixa nesse terreno íngreme até o córrego que se inicia por aqui e vai percorrer pela Vila Pereira finalizando no Rio Juquery. Chegamos onde queríamos. Aqui está a piscina dos alemães. Nem sei que palavras utilizar para te definir o encanto deste lugar. Estamos aqui neste paredão que represa as águas para formar a piscina. Abaixo, uma pequena comporta regula a vazão de águas na mesma proporção com que elas, vindas de uma nascente, penetra na piscina. Isso as mantém represadas sempre ao mesmo nível. Deixando a piscina pela pequena comporta, as águas libertas são o início do já dito córrego da Vila Pereira. Veja agora o trampolim lá no meio da piscina. Está fixado sobre aquela enorme pedra que vinda das profundezas, se sobressai das águas até uma boa altura para se jogar em mergulhos a pique, assim como se dizia antigamente. O acesso até lá só a nado, pois, a pedra do trampolim é uma ilha. À nossa esquerda temos aquelas árvores e por baixo nas sombras delas, entre a vegetação misturam-se as amoras silvestres vermelhas. Como já deve ter ouvido alguns cantos de pássaros, muitos sabiás, inclusive aqueles de peito vermelho ficam nas árvores atraindo seus iguais. Agora à nossa direita, a margem da piscina é de pedra. Ela é enorme porque vinda daquela arborização e subterrânea, ela só se mostra próxima a piscina quando em suave declive se oculta novamente sob as águas. Lembro-me de quando por muito tempo essa piscina ficou vazia parecendo abandonada. Choveu muito e alguém a vendo repleta novamente por causa da chuva, espalhou a notícia. Muitos se deslocaram para cá. Pais com seus pequenos filhos para assistirem rapazes a nadar onde era o paraíso aquático privativo aos alemães. Vi criança soltando barquinho de papel a se balançar nas ondas provocadas pelas braçadas n’água dos jovens atletas náuticos. Também estive aqui com meu pai naquele dia. Se me lembro já sabia nadar no estilo cachorrinho e no estilo arrancão. E meu pai toda hora dizia “fica por aqui, não vai pra onde é fundo”. Ele não sabia que com outros amiguinhos, vez ou outra, eu vinha nadar aqui às escondidas. Além dele, também de algum “fiscal” da Indústria Melhoramentos. Ele, além de nos expulsar do local, poderia ainda delatar-nos para a chefia da empresa e nossos pais seriam chamados para uma repreensão.  Mas, dentre a molecada quando vinha pra cá, alguns vinham providos de bóias.  Eram feitas com latas vazias de óleo. Os furos das minhas eram vedados com cera de abelha e água não penetrava nelas. Com essa “não tão confiável” proteção se arriscava ir nadar até onde “não dava pé” nas águas tão geladas da piscina, ou, seria um lago?

 


Sim, um lago artificial mais visto como sendo uma piscina. Nunca ouvi alguém dizer que era um lago, ou, o lago dos alemães.  Gostou do passeio? Visualize tudo novamente para poder recordar no futuro. Este recanto vai desaparecer e completamente quando das obras da Rodovia Bandeirantes projetada para passar por aqui, cujos entulhos irão desfigurar este local antes da mata descontrolada o invadir. Já é o entardecer e vamos voltar por donde viemos. Rua do Bairro Chique. Memorize-o, ele a mando da diretoria da Indústria Melhoramentos vai desaparecer também, como, todas as casas desta região. Tudo aqui será desolação e eu nem poderei dizer pra alguém que “tenho desejo de voltar pra minha terra” onde vivi minha infância e minha juventude. Vamos embora que já é hora.

                                                                                                        Altino Olympio

Comentários:

Linda crônica! Lugares paradisíacos descritos. Mas, tudo se acabou e esta constatação já  me entristeceu quando, há alguns meses atrás, fui dar umas voltas pelo Bairro da Fábrica.
Nem consegui identificar lugares como o da crônica. Tudo demolido e engolido pela industrialização fria e indiferente à história do lugar.
Felizmente crônicas como esta nos levam a uma viagem encantada e cheia de fantasias. Tristemente ao terminar a leitura temos a certeza de que tudo foi apenas um sonho rápido e que nos levou por alguns instantes àqueles recantos tão importantes da nossa vida.
Adorei e me emocionei! Parabéns ao Jornal “A semana”
Fatima

Pois é – “rezemos para que a raça humana jamais escape da terra, para espalhar sua iniquidade  em outros lugares” -  sábias palavras. O homem tem um lado perverso que tende a destruir tudo o que é bom e lhe faz bem...
É uma pena, façam um abaixo-assinado... Não tem como impedir isso?
Resposta: Impedir o que? Tudo já foi devastado. Tu não sabes porque não és de Caieiras.


MUITO LEGAL... QUANDO EU PASSEI A CHEFE DE DEPARTAMENTO GANHEI O DIREITO DE FREQUENTAR A PISCINA TINHA ATÉ  CARTEIRINHA , EU MORAVA MUITO PRÓXIMO , ERA NA CASA QUE MOROU O SR. CARLOS BAYERLEN , DONA MARINA E FILHOS ......... VISINHO DO ROBERTO BOMBARDI
 RENATO MARCHESINI

 

Muito boa a crônica da piscina.
Realmente ela era o ponto alto da granfinagem melhoramentina.
E as gostosas? Caramba, eu vendo-as daquela cerca...
Por ética não citarei os nomes das minhas preferidas...
Nilson da Curva
 
Adhemar de La Penha Banho, Possante, Leré, Nivaldo Villalobos, Lino Bollo Foffo, Claudio Sulfatto Nani, Zelão Lopes et caterva, reviram-se na tumba ao lerem  a crônica da piscina.
Fred Assoni o Safena

MUITO LINDA A CRÔNICA... EXISTEM RAZÕES PARA SER SAUDOSISTA, MAS, A REALIDADE É QUE TEMOS QUE NOS DESAPEGAR DAS COISAS MATERIAIS... ONDE EU FUI CRIADA NO BAIRRO DO ESTREITO, NA GRANDE FLORIANOPOLIS... TUDO O QUE EU CONHECIA VIROU PÓ E HOJE SÓ RESTAM AS BOAS RECORDAÇÕES... E ASSIM É TAMBEM A VIDA... DE NÓS SÓ VAI SOBRAR O PÓ
POR ISSO DIGO QUE TEMOS QUE APROVEITAR TODOS OS MOMENTOS FELIZES QUE A VIDA NOS OFERECE...
ANA MARIA “GAUCHA” DE SANTOS

 
A crônica da piscina me despertou outras lembranças, mas queria fazer uma observação nessa sua historia ou melhor lembrar de mais um  detalhe que faltou para mim. Ao fundo da piscina ou melhor na entrada da piscina vindo pela vila Morumbi, tinha uma caixa d´agua com  um enorme pé de amoreira, ali além dos sabias tinha eu e meus amigos que se deliciavam com as
amoras, eu lembro  que levava-mos umas canecas de latas feitas por nossos pais  com açucar, nos enchiamos as canecas
e amassava as amoras com uma colher e comiamos aquilo como se fosse o manjar dos deuses, que lembrança.
Meus amigos Nego Gil (in memorian) Nelsinho Favero (in memoriam) Adalberto Ciriaco, Antonio mantovani,
Ao lado dessa amoreira morava sr. Severino R. Gil e familia

Luiz Carlos Corradini


Altino Olimpio