Num sábado ensolarado, acompanhei uns parentes até
a Vila Nova Perus, no Bairro de Perus, onde estavam interessados em alugar uma
casa. Acercando-se do endereço, proveniente do Lixão lá
instalado, um odor pútrido dificultava a permanência naquelas cercanias.
Já desistentes do intento de alugar a casa do endereço, apenas
por curiosidade adentramos nela para examinar seus espaçosos cômodos.
Até onde me lembro, foi na sala de visitas onde fui surpreendido por
sobressaltos e tiques, aqueles que antecedem uma incorporação
por espírito.
Através de agitações, uma força poderosa apoderou-se
do meu corpo tornando-o arcado, com os braços cruzados nas costas, mãos
rígidas e retorcidas, expressões faciais distorcidas com o olhar
paralisado sem piscar e grunhindo como suíno, minha voz vinha das profundezas
inexploradas do meu mundo oculto até então.
Apavorados, os parentes pensando tratar-se de um ataque epilético, aproximaram-se
e foram repelidos com muitos palavrões inenarráveis.
Atraídos pelo alvoroço e piorando a situação, alguns
curiosos tentaram me acalmar e foram furiosamente arremessados à distância,
conseqüentemente, estilhaçando os vidros da janela daquela sala.
Fortemente agarrado por alguns homens, debatendo-me e vociferando impropérios,
numa Kombi partimos rumo ao pronto-socorro.
Distanciando-me daquele local daquela incorporação e com isso
enfraquecendo sua predominância possessiva, readquiri a consciência
normal naquela situação embaraçosa.
Depois do ocorrido, já em casa, os fatos despercebidos
enquanto inconsciente, foram-me narrados pelos parentes antes deles partirem,
assustados ainda como estavam. Nos dias seguintes com o pensamento tentando
elucidar aquele acontecimento desagradável, ocorreu-me a possibilidade
de ter sido incorporado por um Exu. Preocupado com a anormalidade fisiológica
acessível a intrusões indesejáveis e temendo por repetições,
fui consultar-me com uma famosa vidente, também muito procurada por políticos
em época de eleições. Ela pediu para me concentrar e mentalizar
o local daquela minha possessão.
Seus surpreendentes esclarecimentos foram assim: “Não! Não
foi um Exu. Naquela casa, seus antigos moradores mantinham ódio contra
o Lixão. Diariamente através de palavrões praguejavam contra
os responsáveis da instalação dele. Muito sensível,
o senhor absorveu aquelas ainda existentes vibrações pesadas daquele
lugar. Basta manter-se à distância das cercanias do Lixão
para evitar uma possível reincidência sobrenatural, como o senhor
a entendeu. Passe bem e que a paz o acompanhe no seu regresso”.
Nesta crônica, verdade mesmo só os parentes e
a casa para alugar. Tudo o mais foi ficção. Escrita de “encomenda”,
na época ela tinha um propósito que o tempo ao passar, fez com
que deixasse de ser.