10/06/2019
A breve vida de Jojô

Estavamos no sul do país , eu e Ratão ( Coxólogo juramentado e adorador de nádegas femininas ) . Terra boa , abençoada , linda de morrer e fértil em flora e fauna .Trabalhavamos numa obra papeleira de grande porte numa grande fábrica de papel .

A rotina então se estabeleceu . Entravamos as 8:00 hs no serviço , almoço ao ½ dia e saída ás 17:30 hs . Após o almoço , reuníamos todos numa área de lazer onde colocávamos o papo em dia e as meninas do escritório tricotavam fofocas entre si . A área de lazer ficava num canto da fábrica , perto do escritório e fazia vizinho , separada por uma cerca metálica , duma área ainda selvagem de algum outro empreendimento . Seguia a rotina .

Um dia , alvoroço entre as meninas ; Tinha aparecido do outro lado da cerca , um veadinho ainda imberbe , bonitinho , cheirando á neném . As meninas foram ao delírio . Queriam acaricia-lo , passar a mão nele , beija-lo e o veadinho , desconfiado não se aproximava da cerca . Frisson total . Comentário para a tarde toda no escritório .

Dia seguinte , mesma rotina e surpreendentemente , aparece de novo o veadinho ; Festa entre as meninas , deram-no pão, comida , salgadinhos e ele ,timidamente aceitou pois deveria estar com fome . Nisso senti cheiro de morte no ar , não sei porque pois olhei prá Ratão que deixou por um momento de olhar as nádegas das meninas e fixou olhar no pobre veadinho . Em seguida , Ratão olhou com aqueles olhos da morte prá Luiz Paqueiro , mecânico caçador e senti aí , o fim do veadinho Jojô ( este era o nome que batizaram-no ) . Luiz Paqueiro ao ver que eu o encarei , desviou o olhar mas fez um leve aceno para Ratão . Tive certeza então que a sorte de Jojô estava selada .

Não durou dez dias . Luiz Paqueiro fez uma Matraca , armadilha com molas para apanhar animais silvestres e rupestres e escondeu-a de mim pois ele sabia que eu já tinha percebido as intenções dos dois . Mais dois dias e ....aconteceu ! Jojô não apareceu para o almoço e as meninas se perguntavam : Onde estaria Jojô ?? Porque Jojô não apareceu hoje ?? Mal sabiam elas que ele não apareceria nunca mais .

Mais dois dias se passaram e nada de Jojô . A comoção foi geral ,um clima funéreo abateu-se sobre todo o escritório pois Jojô alimentava diariamente com sua graça e beleza as agruras daquele escritório frio e circunspecto .

Porém , dois dias após o sumiço de Jojô , fiquei um pouco mais tempo no serviço e pedi para o mecânico João Adamo me ajudar numa empreitada investigativa . Esperamos o pessoal sair do serviço e fomos até o local onde Jojô recepcionava diariamente suas admiradoras . João tirou uma carreira de arame da cerca e pudemos passar por um vão aberto na cerca . Não procuramos muito e logo vimos no chão de terra batida , sangue , muito sangue velho já enegrecido .Numa pequena árvore , amarrada , a Matraca fechada suja também de sangue . Entendi tudo . Tinham armado a Matraca , amarrado na árvore e pegaram o Jojô , imolando-o ali mesmo .

Lembrei- me então que , dois dias após o sumiço de Jojô , Luiz Paqueiro e Ratão , palitando os dentes , cruzaram comigo e arrotaram .....arrôt , arrôt , fsssssss , arrôt . Chegando em minha mesa , vi um bilhete , escrito com a mão esquerda -“ Se quiser um quartinho de veadinho , temperadinho , passe em casa e apanhe “ .

Assim terminou a passagem de Jojô pela Terra . Morreu porque tinha graça ,beleza , singeleza e porte . Morreu porque ousou disputar com uma dupla de fascínoras , os ternos e lãnguidos olhares das pitéus do escritório .

Meses depois , fui num sábado na casa de Luiz Paqueiro e na sala dele ,empalhada , a cabeça dum veadinho que olhou para mim e sorriu , tenho certeza . Olhei prá Luiz Paqueiro e ele estava vermelho , olhando pro chão e com certeza , envergonhado da perversidade praticada .

Aguardo o castigo divino para ambos .

Fred Assoni



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