Versão para impressão

A mula sem cabeça

A mula sem cabeça

Quando eu tinha dezoito anos de idade eu namorava com uma moça da Vila Criciúma. A última maquininha (trenzinho) para voltar para casa partia de Caieiras para o Bairro da Fábrica às dez e meia da noite. Então, na hora do melhor do namoro era preciso se despedir. Ah não, eu ficava na Criciúma namorando até de madrugada e voltava a pé para casa. O longo trajeto que eu percorria a pé é conhecido por quem foi morador de lá daquele lugar que, como alguns diziam, era um paraíso. Então, isso dispensa detalhar aquele longo percurso que eu fazia pela escuridão da madrugada.

Eu não encontrava ninguém pelas ruas desertas e por isso eu até me considerava como sendo o dono do mundo (risos). “Vejam só” o sacrifício que eu fazia pelo amor de uma mulher e eu colocava a culpa no cupido. Naqueles tempos o amor tinha o nome de delegado, pois, ele prendia as pessoas, umas nas outras e para sempre. Depois de passar pelo Bairro da Cerâmica até onde ainda havia alguma iluminação, já no início da “famosa serrinha” começava a escuridão. A serrinha era uma subida bem acentuada, ou melhor, bem inclinada. Demorava-se para subi-la e depois de lá do alto do fim dela, o terreno, a estrada ficava plana ladeada por mata alta de ambos os lados.

E sozinho naquela escuridão eu me lembrava que lá era onde sempre aparecia a mula sem cabeça, assim como naquela época diziam. Mas, eu que já raciocinava antes de nascer, raciocinei que não havia perigo, pois, se a mula era sem cabeça, ela não teria olhos para me ver, ouvido para me ouvir e nem boca para me morder. Tal raciocínio me deixou aliviado do medo dela, mas, mas, de repente... Ai, SOCORRO! Dei uma p. trombada com um animal naquela escuridão. “Era ela, era a mula sem cabeça”! Gritei, esperneei e xinguei com todos os palavrões que eu conhecia e inventei alguns outros naquele momento de tanta aflição. 

Me afastei depressa sem saber onde pisava no escuro e até fiquei com remorso. Talvez a mula fosse um espírito sem luz e estivesse precisando de uma oração. Eu conhecia pessoas do lugar que rezavam ou oravam para quem estivesse precisando de luz e... ... .... Depois daquele dia prometi a mim mesmo nunca mais caçoar das pessoas que informavam outras sobre os lugares onde tinham assombrações. As pessoas de Caieiras sempre foram muito sérias e jamais iriam perder tempo com mentiras ou com invenções. Eu sabia que na estrada de acesso à Vila Leão do Bairro da Fábrica havia um trecho entre o rio e um enorme morro que se chamava Volta Fria. Era onde haviam fantasmas ou assombrações e os moradores daquela vila tinham medo de passar por lá. Entretanto fiquei sabendo que elas desapareceram. Talvez tivessem morrido ou se aposentado.

Altino Olímpio